quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

"Uma ode ao Neguinho: parte 1"

Eu sempre brigo com o Neguinho quando eu abro o portão. Neguinho é o meu cachorro. Ele sempre sai espivitado em direção à sua liberdade. No caso, o portão.Às vezes quase lanço palavras de ódio e ressentimento contra a porra do portão, pois acho que o portão quer me roubar o neguinho.
O Neguinho sai, dá suas mijadas territoriais e volta. Mas teve uma vez que achei que ele não iria voltar. Voltou três horas depois com o rabo entre as pernas, todo molhado (no dia estava chovendo. Tivemos que levá-lo ao veterinário, ele ficou internado, e além do peso da preocupação o bolso também pesou: entre remédios e internação a conta deve ter ultrapassado uns mil contos).
Além da preocupação com ele (amo muito o Neguinho. E olha que nem é pela exclusividade do amor dele por mim, afinal ele é um vendido, abana o rabo pra todos os meus amigos e amigas que vêm aqui em casa. E ele é um macho safado, minhas amigas e minha namorada que o digam. Ele é um cocotinho melindroso perto delas), me preocupo com as pessoas na rua: deus me livre o Neguinho atacar alguém, isso me mataria. Por extensão ele estaria me atacando também, afinal se ele fizesse isso seria por responsabilidade minha, por eu não ter brigado o bastante pra ele não sair, e se ele saiu foi porque eu não dei todo o carinho que ele queria, por isso ele procurou outros territórios pra mijar, outros seres vivos pra descontar toda sua frustração crescida da minha inutilidade em fazê-lo feliz na nossa casa, e por isso ele foi afogar suas mágoas no meretrício, nas brigas de esquina e nas mijadas baratas da zona da cidade. The guilt is a bitch...
Mas hoje foi diferente: minha mãe ia sair e eu fiquei fazendo cafuné no Neguinho pra mantê-lo perto de mim e o abestado não sair pra sua orgia de sexo e violência nas esquinas da cidade. E enquanto o acariciava fiquei pensando no que é o amor: amor não é cuidar, amor é amor. Cuidar é a expressão do amor e sua potencialização, pois quanto mais você cuida, mais você ama. Mas cuidar não é ter raiva do portão, isso é posse, é eu querer ser o portão, o território, as árvores nas quais ele mija, as cachorras com as quais ele cruza, os cachorros com os quais eles briga, as pessoas que ele ataca ou não... isso não tem nada a ver com ele, só comigo. Ele, como cachorro, nem pensa em ser livre: ele é a liberdade materializada em vontade pura. Já eu sou o labirinto da liberdade, livre pra chegar a lugar nenhum, lugar que eu toscamente rascunhei idealisticamente e empiricamente tal qual o mapa pro paraíso, sem saber nem o mapa pro meu coração.
Então me desapeguei: fiquei fazendo carinho nele e quando ele saísse desembestado e eu só chamaria a atenção tentando expressar o meu amor de tê-lo ao meu lado, não o terror de perdê-lo pra putaria da Arniqueira. E aí se fez o milagre: quando abriu o portão ele se aninhou sentado recostado na minha perna. Como se dissesse: "tá bom, Davi, eu te amo. Eu deixo a zona pra amanhã".
O que fazer quando um animal companheiro (e um companheiro animal) te mostra mais sobre o amor do que todos os tratados sobre amor do mundo? Olhei nos olhos dele e disse:"Também te amo, seu cachorro gatuno...".
E então entrei, desejando que esse cão lindo e pervertido pelo menos use camisinha quando fugir no carnaval.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Manifesto do Caralho na Terra da Puta que Pariu

Saiamos de nossas casas. Não é nossa casa. Nossa casa é nossa cabeça, parede-ossos. Janela-olhos. TV-pele. Não é a Dilma. Não é o Bolsonaro. Não é o marxismo de direita pós-hippie conservador homossexual temperado com dendê franco-dominicano... não é isso.
Quando vamos nos cansar de vermos os outros sob um prisma de espelho pervertido? Discussões sempre haverão, e que bom. Não é a perfeição que importa. Mas sim a busca de um carinho pela sua procura, apesar de termos que olhar nos olhos da outra pessoa com a humildade de querermos nos encontrar neles.
Eu simplesmente acho que a ditadura não eleva nenhuma sociedade pois não há uma auto-conscientização (aliás que redundância: ninguém conscientiza ninguém, só mostra o caminho no máximo. Trilhar depende de cada um.). Quem concorda com uma ditadura é encabrestado, e quem diz o contrário é um jumento em dobro, pois é um jumento hipócrita (e coitado dos jumentos...). E foda-se se é ditadura de direita ou de esquerda, não importa. A evolução só está na liberdade. Mas liberdade não existe sem informação livre. A ditadura não esta nos exércitos, tudo existe primeiro no campo das ideias, e por isso em qualquer ditadura a informação controlada é a maior arma. E o pior algoz.
Chamem isso de romantismo, cristianismo, anarquismo, vontade de dar a bunda, teorizem com algum conceito que alguém ouviu dizer por aí. Ou sejam cínicos: o cinismo realmente é a melhor forma de ser impotente mas com uma máscara interna de orgulho hipócrita. Mas a verdade é que se não nos dispusermos a olhar os nossos semelhantes sem amarras, sem preconceitos, sem esse medo plantado pelos jornais e pela luta de classes estúpida capitalista-comunista-ista-ista-ista, sinceramente a barbárie só vai se consumar mais e mais até vivermos numa sociedade onde eu mato sua mãe pra que sua raça não se prolifere. E qual é minha raça mesmo?
O caminho é a arte, a sensibilização. E se quem reclamasse dos marginais fosse num presídio fazer algo de bom, ensinar algo, que tal? E se na empresa que trabalhamos fizermos um clube de leitura? “Não, porra de clube de leitura! Quero é cachaça e arranjar alguém pra meter (ou pra dar)...”. Estamos todos no mesmo saco. Fudeu. Só que o simplismo da dicotomia é a melhor arma pra gente burra. Por que será que Hitler elegeu os judeus como arqui-inimigos? É mais fácil pra um povo sem autoestima e em recessão ter um alvo e pronto. Pra que maiores explicações? É mais fácil a classe alta poderosa usar a classe média vaselina pra atingir a classe baixa idiotizada: seu alvo. “E eu lá vou pensar no marginal? Antes que ele pule o muro da minha casa eu controlo o Estado e a polícia pra ele nem ter a chance. EU conquistei isso. EU trabalhei”. Aí o marginal diz: ”E eu lá vou pensar naquele ricaço? Foda-se, entro na casa dele, roubo tudo dele e ainda faço o regaço na família dele. EU que não tenho o que comer. EU que não tive oportunidade”. E o ricaço não tem empregados na sua empresa não? E o marginal não teve nenhuma chance? É a luta de classes. E qual é a minha raça mesmo?
Minha raça é a classe média branca tão reacionária quanto a alta e tão fudida quanto a baixa. But not so much... são as discussões totalmente parciais sobre as manifestações: tem gente que só se importa com o congestionamento que elas causam: “porra, eu trabalho e vem esses vagabundos me atrapalharem. Tem que prender!!!”. Mas quando assistem os casos de corrupção na TV esbravejam: “corruptos filhos da puta!!!”. Ou será que ainda esbravejam? Afinal a rotina de trabalho pode ser a pior das drogas, ainda mais numa sociedade que quanto mais sofrimento o trabalho causa, mais digno é o trabalhador... ecos de uma educação católica que preconiza o sofrimento como forma de purificação.
Vamos escutar música. Ir a shows. Ir ao teatro. Ler livros. E nos reconhecermos neles. E falar sobre isso com alguém no ônibus. Ou vamos bater nossa punheta ou siririca no computador, trabalhar em casa por computador, conversar via Skype com um armênio enquanto nossa mãe morre no quarto ao lado.
Cada um com sua escolha. Eu fiz a minha.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

A poesia morreu.

A poesia morreu.
Esfaqueie a sua mãe
Estupre seu pai
A poesia morreu
Eu morri meu amor
Quando a droga foi mais importante
Quando vomitei o seu sangue
Quando quis só te fuder
A poesia morreu
Viva o nazismo
Viva a China
Viva o capitalismo
Viva a vingança
Pra que amigos? Só quero contatos
Pra chegar em algum lugar
E não ter com quem falar
Só com o que falar
Beber, fuder
Fuder, beber
De vez em quando ver alguém sendo morto na TV
Ou na deep web
Deep shit
Só evite o desespero, evite
A Ivete Sangalo é horrível
Mas se ela abre as pernas eu meto até o osso
Meu pau grosseiro e grosso
Batendo uma punheta vendo a morte na TV
Sexo, violência e drogas
Pra que poesia?
Os vermes saltarão pelos olhos quando morrermos
Que nada, eles já saltam enquanto putrefamos vivos
Mas os retardados que mataram a poesia só conseguem enxergar sangue.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Cada um tem o governo que merece

Filhos da Puta-Estado
Nossas tetas já cansadas
Estão expelindo sangue
Jorrando dessas favelas
Cruéis fudidos escrotos
Votam leis de hipocrisia
O menos ladrão do congresso
É pior do que o pior da periferia
Porque o cria
Ninho de escorpiões
Apoiados pelo povo
Maluf eleito de novo
Suassuna sendo protegido
Pelo corporativismo
Merdas que votam em merdas
Você votou em alguém?
Pois se você votou já era:
Você é um merda também
Só que tu é um merda fudido
E eles nadam em milhões
Levantou a bandeira do partido
Que vai enrolar seu caixão
E o do seu pai, seu filho, seu neto
Que vão morrer pelo próprio algoz
Classe dominante e governo contra você
Arrancando sua cabeça, seu cú e sua voz.


Davi Kaus