quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Uma Árvore no Bairro

À luz sonora de J. M.
Há algum tempo, eu e minha ex-namorada plantamos, ambos, uma árvore cada num parque. Um lindo dia: evento num espaço da comunidade, ideias fervilhando nas ideias, eu e meu Amor reluzindo nosso Amor à luz do sol plantando árvores, que talvez se transfigurassem em filhos e num eterno gozo do Corpo e da Alma (mas se até a vida não dura a vida inteira... Tudo bem, tudo bem. A realidade é maravilhosa pelo sonho que a perfuma). Iríamos consertar nossa alma consertando a alma dos meninos e meninas da comunidade junto com nossa amiga que organizara o evento. Eternos momentos.
Depois tudo se esvaiu. E voltou à perfeição. E correu como uma menina-zumbi louca desembestada no mesmo parque. Depois tal qual borboleta-fênix voltamos do inferno de nossas consciências... Vários big-bangs dentro de nossos quartos, não é mesmo? Finalmente fomos embora um do outro, ainda sedentos do arrepio perdido pela estrada destruída rumo ao paraíso...
Após alguns anos, retorno ao parque. Procuro minha árvore, já não sei onde a plantei. Procuro a dela: muito menos me recordo. Estão por entre as outras da turma, secretamente me observando e rindo de mim tal qual nossos filhos se escondendo nos lençóis do sonho revelado em algum momento de um gesto sublime apenas... Mas, imediatista que sou, me entristeço com a brincadeira e penso que os perdi, a culpa foi minha, e as árvores-filhas não gritam por mim por mágoa do abandono... Bem, o que fazer agora, se não tenho mais meus filhos nem a mãe do Amor?

Resolvi adotar uma então. Pensei: qual adoto? Achei egoísta e sem propósito adotar uma já estabelecida, saudável... Então peguei um copo, fui ao bebedouro, o enchi de água, e fui dar de beber à segunda criaturazinha da direita pra esquerda, da primeira fileira do primeiro quadrante tendo como referência a administração do parque (não vou mais esquecer!). Havia um funcionário adubando as árvores. Cumprimentei-o para ele não achar que eu era o doidinho das árvores (ou para fingir melhor que eu não sou, hehehe). Simpático, ele retribuiu. Comentei sobre a árvore que eu plantara. Ele citou a célebre frase: “Todos devem plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho”. Concordei. Legal ele.
A árvore está magrinha, frágil, tal qual meu Amor pelas coisas hoje. Mas levantei da cama mesmo assim, e fui enfrentar o mundo deixando-o me envolver com sua parte de carinho e pensamentos bons. E adotei essa criatura que agora apelido de Verde Amor. Quem sabe ela cresça, na mesma não-medida que o Amor dentro de mim, e quando ela estiver bem forte eu terei esquecido meu Amor por ela, pois Ele terá sido perfeitamente passado pra ela, e eu não precisarei mais contabilizar meu egoísmo na realização dela em mim: bastará a felicidade dela, no seu esplendor independente, e o meu humilde orgulho, como quem molda uma linda oração pra uma Deusa que já existe (Poesia é a Deusa-Vida moldada em olhos de horror de Amor vomitados ritualisticamente no papel). Não é a minha filha exata, até porque é o Amor que se ajusta ao Amado: o que importa é o amar, e não o quê ou quem se ama.
Peraí: vai que é minha filha!!!!?...


Nenhum comentário:

Postar um comentário