terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Perfurando

A liberdade nasce em mim perfurando
De dentro pra fora
Como água fervente que jorra
De um cubículo de carne chamado coração
Trabalharam a prisão em mim
Agora preciso trabalhar o túnel pro outro lado desse oceano
Ócio-anos
Ocre anos
Meio sépios...
Me sinto meio sépio
Olhos-sépia
Interiorizada a cor da saudade...
Não quero mais falar disso
Mais uma vez o precipício
Invento linguagens novas pra mesma língua
Pra de repente reprogramá-la
Mas tudo de repente repete a míngua
Do pulsar cardíaco diluído na fala
A fala é incompleta
Quando repentina
Ou é no susto que estatela
A porcelana que flutua
Junto com o Elefante na tela
Chamada sala?
A liberdade brota em mim como a flor de um vaso flutuante na sala
Que ao cair perfura o olhar como o aparecimento de uma alma
Que prende e libera ao mesmo tempo
O mesmo coração.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Sonhos cíclicos

O sonho acabou
Não passou de um sonho
O sol reluziu na dor
Da luz do dia enfadonho

Já nem lembro o que sonhei
Me entreguei prum mundo hostil
Acreditei em poetas gays
Num país como o Brasil

Mas a decadência não é exclusiva
Das pátrias, meus olhos jorram o nada
Que sangre minha esperança exangue
Na ponta dessa navalha

Picharam meu amanhã
Com tinta de quadros nobres
Como a dor de Van Gogh vale
Milhões com ele no túmulo

Então se mate com a moldura
Do que podia entender nos olhos
De repente tem anjos que só deixam sua cura
Num planar de asas multicolores...

O sonho acabou...
Quem sabe comece outro
E sonâmbulo sem rumo
Eu vá de encontro a esse ouro.


À vista no olhar

As costas pesam porque não nos concentramos nos braços
Damos tiros porque é de longe
E ficamos muito perto nos abraços
O sol arde porque o confrontamos na hora errada
A encruzilhada pode ser uma confusão
Porém mais opções de estradas
Da insônia brotam poesias
Do cansaço brota o orgulho
Sofremos antes com o frio
Mas nos acostumamos com ele no mergulho
Na ardência da pimenta, o gosto
Na boca, em outros lugares nem tanto
Um lençol no meio da rua, sujo e tosco
O único abrigo de quentura, sagrado manto
A sombra que assusta um milissegundo antes
De percebermos que é a silhueta do Amor
Na contrapartida o gozo hipnotizante
Logo antes da mais lancinante Dor
Um ponto de vista, um ponto pra vista
Mil pontos de vista, mil pontos pra alma
A vista da essência nos mil trajes que se vista
Nos pontos da agulha que não dói mas traz calma
E traz pra cá a alma:
Pontos de agulha no crochê da alma.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Ecos do Coração-Clarice

O êxtase
A machadada final que faz uno
Lenhador
Lenha
Machado
No nanosegundo do impacto
É o não que força o fim
Fincando o fim na fala
Mas ressoando o talvez
E o talvez é o Tudo que se teme
O Tudo que teme ser tema
O Tudo que teme ser maiúsculo
Por não se compreender...
É muita responsabilidade pro Tudo
Ser maiúsculo
Másculo na grafia
Minúsculo na Poesia
Que o perverte e o sodomiza
Pra torná-lo completo...
O êxtase
A batida final que faz uno
Corpo
Coração
Alma
No nanosegundo da Morte
O coxixo de Deus no estalar da última chama
O milímetro de Verdade
Que a vida toda reclama.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Lá dentro

Deite lá dentro
É pulsante, vermelho,
Quente.
Ainda não puro
Mas não assim tão obscuro
Quanto minha nostalgia triste sugere.
Mas com Amor
Um Amor confuso que ainda não decifrei
Por medo do término do ciclo
Que mil voltas já deu
Em vis voltas já veio
Espirais buraco-negro no meio
Que a cabeça deu a volta no eu
Dando os nós...
Lá dentro a eternidade pulsa
Vermelha, quente,
Nas lembranças tão lindas
Quanto a distância do tempo
Mas tenho me sentido esquizofrênico
Ninando a sombra
Com mãos de veludo
Percorrendo a montanha com os olhos
E o mato coçando os pés do absurdo
Como o nada
Que se surpreendeu com o tudo
Dentro de si.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Homenagem ao lamento sertanejo

E a boiada revoou aos céus ao som de um celo
Levando minha alma junto
Numa ancestralidade de quentura, calma firme e solidão
E as lágrimas sutilmente se juntaram à poeira:
Palavras-poeira na beira da estrada do meu coração...
Que venham as palavras nesse coração sertanejo
De saudade, infinito azul e o aperto do coração
De quem não sabe do amanhã
E luta com a única arma:
O hoje
Na boiada
Do celo
No ar revour
Da arnica
Tudo brotando infinito
Num grande rito
Grito árido com brisa de chuva
No meu ser.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Conforme o conformista inconformado (in-con-forma)

Tem vezes que não dá certo.
Crianças abortadas
Corações partidos
Irmãos separados
Pais que morrem cedo
Guerra velada na paz
Morte de santos que no final tanto faz
Vontades desenfreadas na pista
Parcelados que vem à vista
Bocejos mil e o sono não vem
Noite multidão a manhã sem ninguém
E o sono vem mas o descanso nunca
Ronco profundo mas o pesadelo na nuca
Num arrepio acordado e elétrico
Num choque dormente e tétrico
Despertando pra falta de energia
Na mais brilhante ribalta
Me puseram pra baixo
Do tapete
Do olhar
E num instante me gritaram mas estava a me matar
E a vaidade fez meu sangue tão vermelho
Quanto Morte
Burra e em vão
Como que se sentindo decadente
Sem nunca ter estado no auge
Como a baixa autoestima
Escondida na vaidade
Arrependimento egoísta
Travestido de saudade...
Tem vezes que não dá certo
Pra que um dia dê
Preciso confiar nisso
Apesar de você.



quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Vícío na língua

Sinto o tempo até a tampa
Tampo o tempo e ele transborda
Tento tanto o tempo todo
E o tempo é a criança na borda
Da piscina turva e tão morna
Quanto o sangue da placenta
É tão cíclica essa morte
Quanto o norte que se inventa
Beije o amado e seu caixão
Sugue o céu do morto chão
Pise forte pise fundo
Nesse insensível segundo
Siga o rastro da ferida
E me veja do outro lado
Siga o segredo da vida
Beije o caixão tão amado
E se lembre: me esqueça
Sua cabeça é mais que isso
Quando a língua é só um vício
Não há poesia que mereça.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Estrangulando a esperança como um mendigo, enfie a rima

Estrangulando a esperança como um mendigo
Que só quis um "eu te amo"
Ou uma dose pra eterna reavaliação da sua vida já perdida
(Que dá no mesmo do "eu te amo")
Às vezes o espelho me assalta com um tiro
No meio dos olhos.
A catarse do passado me lembra mais um medo do futuro
Como um animal cego com medo do escuro
Corre pra se estatelar no muro...
Mas não se preocupe: o muro ganhou
E não há sequer um sinal mínimo de verdadeira revolução
Porque você quis palavras de ordem no muro
E você reclamou do muro
Vazio
Prontinho
Pra ser
Pichado
Como um animal cego no escuro você não viu o presente correndo com as correntes invisíveis sangrando Suas pernas invisíveis.
E se você queria uma poesia
Mais linda do que a vida
Enfia a rima no cú.

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Não é um haicai, mas eu tentei (para Janine Carvalho)

Às vezes me dá uma felicidade
Que me dá vontade de chorar
Mas não é porque eu sei
Que ela vai passar:
É só porque é muito bom mesmo.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Muro, poste, pessoa, solidão (Amor de amantes na cidade-desespero)

Preenchem os telhados dos prédios
Os cigarros da decepção
Assim como os cigarros dos amantes.
Sonhos que vem e vão nas fumaças mais fumaças mais fumaças
Pensamentos esfumaçados
Como os quartos não faxinados
Da mente
Meu coração se aperta todo como a criança que abandonei lá
Com seus choros por carinho e vida...
Me ame, me gaste nas suas pernas cansadas de tentar
Tentando correr sempre mais
Pra chegar logo a nenhum lugar
Meus olhos te perseguem na névoa noturna de um dia ensolarado
E na espera angustiante da sua ida
Os cigarros se acumulam
Os da decepção
E os nossos.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Paz

Meu coração voa pesado num mar de martírio
Que me prepara pruma manhã de plumas brancas
Do meu amor que não acabava
Por não se gastar
Gasto agora o gosto pra que venham outros
Gasto o ouro pra que a prata tenha seu valor
De essência.
Aquele brilho branco misturado à luz perfeita
Aquele brilho no escuro do aperto do peito
O deus perfeito na confusão das seitas
Seu coração no seio da canção
E meu rádio em perfeito defeito

Que a paz se restabeleça
Nesse mar de plumas brancas
Confusão de deuses nas seitas perfeitas
Deuses
Eu
E
Você.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Morte

Me sinto sujo pela merda que você me jogou
Me sinto sujo pela falta de amor
Do amor que arrancastes de mim
Com olhos tão poderosos quanto inúteis
Mas não posso deixar me contaminar
Essa sua soberba disfarçada de autoestima
Porque se és hipócrita comigo
Ainda resta uma esperança no cair em si
Ainda.
Mas por enquanto desisto da força do perdão
E me resguardo no meu sentimentalismo barato
Que sangra imagens de ódio impossível
Como um elefante numa caixa de sapato
Meu coração enrugado bate um estrondo surdo
Como um estertor quase inaudível da morte de um santo
Que sabe lá no fundo que não sabe o que é o Tudo
Das santas escrituras que o guiaram pelos anos
Anos de auto-flagelo
Mas hoje deus morreu pra mim
Pra que no som funerário do celo
Nasça uma linda sinfonia
No fim
De mim.

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Amor (Entranhas)

Eu quero ver seu Amor
Amor: suas entranhas,
Estranhas vontades,
Gritos no medo do escuro,
Risos jogados ao sol,
Pichações atrás do muros
Junto com o gozo mais sagrado
E a menstruação mais sangrada
Me deixar lamber o seu sangue
Pra deixar eu sentir a sua alma...
Quero que gema não pra se mostrar
Mas pra se mostrar
Pela vontade de que seus gemidos me pesquem do abismo
Do meu corpo
E o nosso gozo se torne eternidade
E não apenas uma bolacha de chocolate
Que se come o recheio
E se joga a casca atrás do sofá...
Eu não quero ser nada seu
Marido, pai
Algoz, escravo
Uma tábua de passar
Quero ser uma blusa esquecida no fundo do armário
Mas que quando se põe
Veste-se a pele do casulo no qual a lagarta se reconhece borboleta:
Possibilidades de se reconhecer...
Quero ser parte do seu Amor
E que quando formos embora
Eu seja uma lembrança do que você se tornará.


quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Te amo, Mãe

Quando ele se foi
Uma parte de mim se calou
Medo de amar
Não mais amar como eu te amo
Como eu te amo...

O seu Amor
É tudo o que não poderei tocar
Porque quem é só sabe ser sem pensar
Eu sou o Amor
Que você injetou em mim assim
Como alguém planta árvores no mundo

Eu sentirei saudades
Quando a força da idade
Te levar pra onde eu irei
Quem sabe Deus exista
E no final da pista
Depois de morto de saudade eu não morrerei

E por isso que hoje
A minha mente foge
Quando praguejas ou ri, não importa mais
O Amor recicla a dor
Te amo, Mãe-Amor.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Uma tarde qualquer (poesia feminina)

Procure dentro dessa ânsia
A saída
Esse nó na garganta é medo de ficar sozinho
De gritar e não ser escutado
Visto, não escutado
Vestes rotas copiadas
Fotografada e esquecida
Como uma foto que se vê de vez em nunca:
Lembrança, gaveta e volta ao passado.
Quero me acostumar com a solidão por amar demais os outros
Te afasto pra que você não me afaste
Mas acabo só do mesmo jeito...
Eu quero aquela sensação que vem da luz eterna
Eu quero a queimação que a corrida dá nas pernas
Queimando a largada só pra não precisar
Chegar a lugar algum.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Oração-microfonia

Um dia eu torno uno
Quando me tornar todos
Ultrapassando meu ego
Em ver só a conivência dos tolos
Sem ver que pode ser
A porta aberta dos humildes
Conivência dos tolos
Ou porta aberta dos humildes
Conivência dos toldos
Porta aberta dos limites
Convivência dos mouros
Porra a merda das vitrines
Covninenciadosoumros
Porrrtnabrectaodslitimes
Cnovimenciaodssouros
Pornameladlominginis
....................
____________________

Pensamentos

O nojo vem de não sabermos o gosto
De quando comemos algo amorfo.
O medo vem por não termos máquina do tempo
Pra entender que tempo não existe.
E o cigarro me salva mais uma vez de mim mesmo,
E o vício no gesto demonstra sua total falta de alma
Como os popstars em coreografias sincronizadas
Dez almas penadas sem nenhuma pena
Cantando em sânscrito o vazio preenchido do céu ocidental.
Eu te quero como uma boia contra minha falsa encenação,
Ou como uma boia contra minha verdadeira encenação:
Eu te quero como me quero.
E a cidade são placas de demônios sedutores
Segregando santos pra sanarem a própria santidade demoníaca
E os santos revoltados não percebem a semente do mal então plantada
Na humildade que a bondade traz
Antes do cair em si da inoperância
É uma poesia (quase) infinita
.
...

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Do outro lado da vida, a Vida

Sangre, mas não doa
Veja, mas não olhe
Como um sino que vibra mas não soa
Como a sina de quem vota mas não escolhe

Chova, mas não molhe
Corra mas não escape
Como um afogado que a água não engole
Como o crucifixo no pescoço de Sartre
Como uma criança no pescoço do padre

Não. A vida é mais que isso
Assuma o precipício
E o seu bafo se torna almíscar

Não. Meu coração é quente e vivo
Não me contento com resquícios
De algo aqui que me assanha e assim grito:
A Vida.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Punk.

Eu vou conseguir
Nem que seja na morte
Nem que seja na sorte
Eu vou conseguir
E como eu sei que eu vou conseguir
Por isso já tô conseguindo
Tô lutando
Tô tocando
No meu íntimo
Fractais de amor
No todo limbo
Essa é minha oração
No meu covil
De país morto mas festeiro
De pai morto mas mãe eterna
Da minha amada que faz eu me amar...
Não desistam de mim
Porque eu não vou.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Masmorra de mil céus multicolores

Há uma vastidão aqui dentro que jorra tempestade marítima
Mar alimentando água, água alimentando mar
Onde tudo é uno tal qual molécula
Uno mas cada parte autêntica...
Tal qual meus olhos alimentam as escuridões
Tal como alimento o absurdo com explicações
Eu e você numa simbiose sem dependência
Imantando as histórias dos livros com vivências...
Eu quero que os carros levitem agora
Ao sabor da minha visão
E que na queda brutal, ao se despedaçarem
Que buzinem no ritmo do meu coração
Eu quero entortar aquela viga de concreto
Me concentrando no ódio
Eu quero estar junto com as mil pessoas
No pódio...
Eu quero pôr pra fora a vastidão
Pois ao mesmo tempo que é a liberdade bruta de mil céus multicolores
Só aqui dentro é uma masmorra imunda
Pro meu coração.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

"Simples (oração ao Deus-caramelo)"

Coma um caramelo
Adoce a sua vida
E que um simples caramelo
Tire o peso da ferida

Compre um caramelo
Por apenas um real
E que o resto do seu dia
Vire um eterno carnaval

Deixe o amor entrar
Que depende da sua dor
Pra termos vontade
De repararmos no amor...

Poeta bom é poeta eterno

...e enquanto o vento rói as ruínas
Descabelamos as palavras em nossas mãos
Querendo que o cachorro louco encontre o rabo
Nós que nem vemos o nada no vão
(Mas) vemos tudo (aliás)
Um poeta sempre vê em vão
Bem sabe Deus, essa força nula
Como o céu que me faz desabar em lágrimas...
E os poetas descrevem em aura-sangue
O tempo-tonelada
O Deus-caramelo
O sorriso-covinhas
Que é a cova da minha dor
Ou a dor da minha alcova
Apenas cave as covinhas
Com mãos suaves de uma súplica de Amor
E Perdão...
E que nos perdoem por sermos poetas vivos
E que aprendamos com os poetas mortos
Que espalharam suas almas nos livros
Como um eco de amor ressoa à porta
Da eterna
Memória.
...

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Playboy babaca se descobrindo gente

O QUE QUE CÊ TÁ OLHANDO?
O QUE QUE CÊ TÁ OLHANDO, PORRA?!
O QUE QUE CÊ TÁ OLHANDO, PORRA?!
QUEM QUE CÊ TÁ OLHANDO?
QUEM QUE CÊ TÁ OLHANDO?!!
ME DIZ...
ME DIZ, POR FAVOR!!!

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Grito Primal

Eu quero o grito primal
Nos gritos secundários
Transformados em primais
Eu quero Jesus e o sudário
Indissociáveis
Eu quero que desça como um Exu
Foda-se o filtro
Eu quero o seu Amor
De novo, de novo, de novo
Eu quero a ancestralidade que emana de um ovo
Eu quero que a porra do meu ovo
Ejacule o eternonovo
Eterno no ovo
Ovo bem passado
Fritando na frase
Estralando na frigideira-futuro
Eu quero ultrapassar a Lispector
Descobrindo a essência-Clarice
Ser a perfeição dos mestres
Que na volta do espiral
Sempre volta a aprendizes

Coração-cárcere

Vejo a saudade nas nuvens
Nesse projeto de céu que ao mesmo tempo me revela
Mas me cala
Será só eu no céu
Será Deus insinuando seu véu
Ou independente de mim
É doce o mel
E é mera coincidência o gosto
E a boca?
Foram os melhores momentos
Que se foram
Destruí as mais lindas rosas do meu coração
Por medo delas não nascerem mais
Então elas insistem porque são minhas amigas
Mas não sou digno
Não me sinto digno
Não importa o que eu faça...
Me maquio
Ponho a melhor roupa
Mas meu coração bate por um favor concedido
Humilde e submisso
Tudo mas só isso
Como eu queria que ele estivesse aqui
Pra não pôr a culpa na sua deserção
Quando ele me abandonou no meio da guerra
De desbravamento do fundo do meu coração
E nem chorar choro mais
Sonho com lágrimas
Coração-cárcere
Que ele venha através do sol quadrado
Mas raios livres.


sexta-feira, 18 de julho de 2014

Parindo, parando

Meu semblante pesa na cabeça de concreto
Me sinto personificando a cidade:
Caos tentando se encontrar
A Eternidade tentando se resumir
Pra que a sombra que entrou e se foi pela janela
Capte um pouquinho da aura Dela...
Ah, está quase vindo
Sinto um menino-futuro dependurado no ventre da minha alma
Me sinto parideira quase parindo
Mas sempre quase parando
E a poeira remanesce estratégica
No meio da torrente criação.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

"Morto-vívido"

Tudo espalhado pelo chão
Celulares e corações
Já não fazem mais ligações
Não ligam pra pedir perdão

Frio na barriga
Vomitando frustrações
Rezando pra que não aconteçam mais
Inevitáveis ações

Hoje começa o pior frio
Pois é morno
Aquele limítrofe vazio
Do quase morto

E mais uma vez o álcool não conservou
E darei mais um gole
Como aquele que nem amou
E ainda sim sofre

Ou de repente finge muito bem
Que não amou, ou sofre
E quando não importa mais nada
Só o gole

Hoje começa o inferno
E estou vivo
Um inferno no ar disperso
E assim mais vívido

terça-feira, 24 de junho de 2014

Casais nucleares

É uma tarde linda a que eu acho em seus olhos
É a conjunção perfeita entre pele e aura
É simples. Não é correto.
Simplesmente flui. Certeiro.
Certo em congruência com o coração,
Que levita sem peso no peito.
Mas aí vem o vendaval violento virulento
Lento como um gigante grotesco engolindo
O lindo laço que agora se lança num lamaçal
De lodo e dor
Raiva e torpor
Acusações sob medida
Moldadas ao nosso orgulho
E o algodão se vai
Num furacão de rádio surdo
Num quadro sub-conscientemente transcrito
De um livro de Descartes
Totalmente descartável...
A Guerra Exterminadora dos Zilhões de Mundos
Numa coçada de bunda
A extinção das Baleias Voadoras cor-de-carvão
Num olhar sorrateiro
Numa palavra maldita fudeu-se o mundo inteiro:
Casais nucleares...

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Soneto de Medo e Coriscos

Medo que exaure as veias
Que de velho é putrefato
E que pelo mesmo fato
Arde em miasmas cinzas, feias

É uma liberdade refletida
Que, sendo assim, não é liberdade
Imagem grotesca de um surdo alarde
Num espelho que é só rascunhada a vida

Mas no coração os coriscos saltam
Em cada batida ancestral
Vencendo a morte também pura

Ciclo vivo que as mortes exaltam
Misturando o deus e o animal:
A morte da esperança que é cura.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Poesia Fluida

Tremo enquanto gozo
O gozo, santo e poço
O frio é quente e grosso
Como cuspe de ressaca
Eu não quero mais a veste
Que assassina a minha pele
Que não afaga, só reveste
E que coça bem de leve
Leve feito arma branca
Leve feito membro em falta
Essas amputadas mãos
Tateadoras da minha alma

É um cansaço que é alerta
Um cansaço que alerta
Pro motivo do cansaço
É um alerta pro cagaço
Que fez todo esse cansaço
Num cagaço sem porquê
Na repetição do medo
Na inconstância dos clichês
De ser sempre o mesmo sangue
De reter os mesmos versos
Só pra manter a pureza
Do que tornará-se inverso
Não importa o que e por quês...

Tremo enquanto gozo
É um alerta pro cagaço
Um alerta pro cansaço
Que constrói a minha revanche
Que reveste, coça e afaga
Imantada armadura
Que pela pureza da pele
Também torna-se tão pura
Como essência transferida
Misteriosa sinergia
Entre criador e criatura.

terça-feira, 27 de maio de 2014

O Vazio

É um vazio
Que vem à noite
Depois do amor
Depois do açoite

Não importa

É um vazio
Clariceano
O eterno agora
Em vários anos

Atrás da porta
Que quase abre
Porém a porta
É a própria chave

É um vazio
Perceba isso
Que o seu passo
É o precipício

Escolha a estrada
E o precipício
Pra cada vida
O seu vazio
Vazida
Vidazio

quinta-feira, 22 de maio de 2014

O Caos e a Flor

A verdade está escondida no rosto
Nesse olhar que me promete força
No ditador que arrefece o gosto
Da forca
E nos discursos apaixonados
O sangue a garganta prevê
O beijo que soa metálico
No "Eu te amo" que ainda quer ser
Por um fio eu farejo a fôrma
Mas sempre algo passa do ponto
E sempre pro espelho em cada conto
Aumento um ponto
Quero acreditar na sua vinda
Eu belo, tu, mais linda ainda
Eu quero a completa acepção
Do querer
Então que emerja da gente mais gente
Quebremos os nós de nós mesmos
Que desatemos um ao outro
Salvando os remendos
Que os nossos medos lá atrás
Nos acompanhe sempre jamais
Sempre só para lembrarmos
De esquecer
O que nos cala e destrói
A potência pra sermos heróis
Desculpas que inventam por medo
De sofrer
E as desculpas pra não acreditar
Que do caos também surge o amar
Que as flores o concreto a beijar
Abençoam eu e você.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Deserto Soul

Árido
Cuspe grosso que rasga a garganta seca
Um implorar surdo numa imagem absurda
Imagem gritante
Me sinto devastado
Pelas milhões de tentativas
De sacralizar o gozo
O gozo sacralizado é o gozo pervertido:
O gozo é feito pra ser mundano
O contraponto Demoníaco
E por isso integrante
Da epifania Divina

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Tempo de cansaço

...é que naquele tempo a luz era cadavérica
mas cadáver de bebê
Quando os ossos ainda carregam
Na alvura reluzente
A vontade de viver
Se não cresceu, catástrofe
Mas pelo menos a potência se manteve:
Faleceu no sonho...
Não, não quero falar daquela tristeza
Que é essa que me dilacera no quase-tocar
Das manhãs nubladas iguais à noite
Nem do fim do nosso Tempo
Quando as feridas não pegavam mais remendo
Puídas pela mágoa e a desesperança
Tá, é bem certo que só não me matei por masoquismo
É bem certo que não te matei por cinismo
Pois você implorou com olhos de águia enferma
Que impedida de voar não tinha mais sentido
Tentei engolir de volta o coração que você me devolveu
Mas pra quê se ele era seu?
Sem uso pra mim e pra mais ninguém
Réquiem prum corpo naufragado
Cenotáfio mesquinho e abandonado...
Não quero falar daquela tristeza
Dos anarquistas desiludidos
Dos sonhos destroçados pela fatalidade
À época que ousamos desafiar a Bomba
Apenas com o olhar invencível...
Que perdure a essência da inocência
Mesmo que envolta nas mortalhas
Amareladas e gastas da decadência.


quinta-feira, 8 de maio de 2014

Duo-uno (molhados)

Emerge das mãos a sensualidade feminina
Imergem as notas agudas no excitado ouvido
E a língua passeia nos cumes e reentrâncias
Preparando com afinco e sutileza em cada instância

Língua molhada em orifícios molhados
Suor que nos dissolve pra virarmos duo-uno
Seu toque mais suave me faz rijo e poderoso
Derreta-se na minha virilidade em carne e osso

E o coração mais rápido
E os ruídos tem o peso
Do hálito de feromônio
Feromônio que enlouquece
Feromônio e alma tecem
As paredes do manicômio

Te agarro na esperança
De entrar dentro de você
Tal qual entro nessa hora
Língua membro dentro fora
E os segundos viram horas
Nessa pele agora Aura

Ahn... nesse instante o amor nasce
Oun... nesse instante o amor morre
Shh... os olhos se viraram
Para olhar pra dentro
E o duro se derrete
E as pétalas ao vento
Dessa Rosa embebida
Em fluidos de sentimentos
Eternos do Agora
E as secreções vão embora
Alimentadas pra depois
Já tatuadas na alma
Toda potência e calma
Desse Big Bang a dois.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Que se alastre

Fogo que se alastra como espasmos do espírito
Rosto lindo e lesado tal qual gosto de gozo
Confusão entre o chamado do abismo e sua chama
Que ilumina o breu do nada assim fazendo-o Todo

Todas as sementes estão vivas na sua morte
Todos os dementes amam tanto a sanidade
Que se obrigam a vê-la no final do último corte
Das cordas perversas dos títeres da verdade

Quero te salvar pra me enxergar na sua vitória
Quero chafurdar na sua luz eterna de glória
Afinal a luz mais rutilante de Glória vem da Merda

Desse fosso lindo que chamamos Redenção
Sempre emergem juntos Glória, Queda e Coração
Nunca impossível a distância que é incerta.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

A Vida (e os Demônios Falantes)

Pulse vida
Volte retumbante
Você é querida
É alma e sangue
Reconstrua a calma
Nesse inferno de Dante
Reensine o silêncio
Pros meus demônios falantes

Eu quero e eu vou
Não sou um caso perdido
É só a força do Amor
Provada no precipício
Rosas e fel na brisa
Que emana do escuro abissal
Pulse retumbante, vida
Firme e leve como um animal

Na sujeira eu quis o puro
De quem não tem mais nada a perder
Na beleza do absurdo
A aura da razão quis apreender
Acho que estou pronto, vida
Erro e acerto iguais
Um pouco de afago à ferida
Pra eu focar na felicidade
Um pouco mais...

Segredos da Caverna

Enquanto uns segredos se desvelam
Outros emergem sorrateiramente
De cavernas sorrateiras
Não sabia que cavernas continham estrelas
Esses segredos-estrelas mortos mas de brilho
Tão inatacável
Quanto impraticável
Caverna mental
Estrelas míticas
Mitos serão mentiras se não afagadas
Com a aura romântica dos desbravadores
Desbravo as dores como alguém que alimenta a peçonha
Do animal essencialmente traidor
Atrás de trair a dor rasgando-a...
Deixei-me tragar pela imagem da caverna
Sem saber que ela é só alegoria
Me apaixonei pelo riso sem saber por que ria
Quero esvaziar meu coração-caverna
Ele está abarrotado de escuridão
Cadê as estrelas que tanto procurei?
O segredo tomou consciência de si e se escondeu
Venha, meu segredo, e me conte aquela novidade
Que eu já sei, aquela linda promessa
Já cumprida que se vestiu de promessa
Apenas por pura Poesia
Eu acredito em você...

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Ilíaca

Nas veias da cabeça
Nas veias dos meus ossos
Na pele do joelho
Nas veias do cabelo
Nos ossos do cabelo
Drenando o cerebelo
Parindo da minha tíbia
Do fóssil que sou hoje
Mais podre que as múmias
Fuçando o fóssil ínfimo
Quebrando a crosta-creme
Nas veias da cabeça
Na ilíaca da minha alma
Partiu meu coração
Às vezes vem a calma
Mas dura três segundos
O resto da minha vida
Com a fratura exposta
Sendo fóssil já novo
Tal qual um podre ovo.

Para Edgar Amaro de Barros, pai de Valéria Dusaki.
Em memória.


Valéria Dusaki

quinta-feira, 17 de abril de 2014

!

Em longínquas eras
Outros ouvidos doeram
Outras almas sofreram
Em noturnas querelas
Com o espelho

Tentando achar palavras
E só achando o silêncio
Depois da peleja travada
Com o fulgurante pensamento
Que não explode

Os cães lá fora latem
No relógio os segundos batem
E eu nessa agonia augustiana
De expressar algo que me assanha
Causa cãibra cerebral

É uma mortalha de mil panos
Dentro minha alma chora mil prantos
Triste não exatamente por tristeza
Mas por não conseguir com destreza
Dizer o que se quer

Não há profundidade suficiente
Na caneta pra descrever o abismo
Abissal latente na pele demente
(e essa frase ainda soa eufemismo)

Quase consegui.
Boceta da desgraça
Cabeça de pau
Cabeça doendo
E amanhã como sempre
De novo tento... De
Novo.


Valéria Dusaki

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Tempo dentro dum relicário

Tempo-ácido.
A cada hora que passa
Mais o tempo passa e um pouquinho
Do espelho racha.
Imagem flácida (como as margens plácidas.
Onde estará Plácido Domingos?
É que eu só saio aos Sábados...)
O pau já não sobe
A boceta já não molha
Coração já não dispara por medo da morte
O tempo tem me feito sofrer
O tempo tem me feito perder tempo
Bateu um desespero! A fada-madrinha
Está derretendo vida afora
Vida fora daqui. A vida faz é sumir
E a encontro apenas em relicários
Dentro de relicários dentro de relicários.
Túmulo-relicário...
Todos me acham meio tapado
E eu realmente queria ser tapado
Como eles para não sofrer tanto
Mas ignorância não é benção e isso
Está tatuado em minha alma.
Boa noite.


Valéria Dusaki

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Canto Eterno, Ciclo Revolto

Com o passar dos anos,
Me apeguei mais ao passar
Do que aos anos
Furacões nasceram nos cantos
E me esfolei ao tentar velar
O secretíssimo canto
E com o passar dos cantos
A túnica dos coristas compus
E ornei o palco como se orna o altar
Mas o altar é a extensão do santo
Sendo o puríssimo canto sua luz
E sob o Canto Eterno a túnica está a se desgastar

Tenho sido sombra desesperada pelo Sol
Num desespero tão fatalista que dá dó
O Dó central das túnicas dançantes
E o secretíssimo canto cada vez mais secreto
E a sala adornada com os quadros mais dejetos
Beleza de insipidez das mais intoleráveis
Eu quero te tostar no Sol das Cinco da Manhã
O nosso Sol de Órion que explode no afã
De nos tornarmos completos, nós os Astros Nanométricos
Sentir a Eternidade no estômago febril
Eu quero a verdade do primeiro de abril
Eu quero a poesia que se esconde quando Falo

Sangue singrando como barco perfeito que é
No ciclo revolto do Mar da Desistência e da Fé.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Síntese do epitáfio da gênese

Veja meu rosto pálido
E meu pênis ereto
Sexo, drogas e destruição
Meu moral flácido
E minha moral reta
Mais um milênio pelo chão
Mas mesmo no claustro
Eu encontro um ombro amigo
Fogo na pele mas não no coração
Da desilusão segui o rastro
E outros desgraçados vieram comigo
Parece genética essa propensão
Ou são sintomas apenas do mundo
Em estelar regressão?
Eu olhei pro lado quando olhei pro espelho
E não adiantou pois você foi o meu reflexo
Minha razão foi de encontro ao instinto
E lendo o kama Sutra baseei o meu sexo
Como se Dionísio trepasse com Apolo
Sonhos despertassem inférteis solos
Os Smiths tocassem infindáveis solos...
Sigo o instinto pensando demais
Como nós (nós) animais racionais
Deuses-animais, homens infernais
Faço isso rondando o equilíbrio
Como um cachorro atrás do próprio rabo
Como um pai que é neto e filho
E como um grande Poeta que não é
Um livro nunca acabo...


Valéria Dusaki

quarta-feira, 2 de abril de 2014

A lâmpada é um mosquito

O futuro está no cigarro
Sonhos em pensamentos tumultuados
Vai ser sempre assim, claro:
O ontem vai estar sempre ao seu lado
E teremos saudades de hoje.
E isso já foi dito ontem, e eu lembro
Hoje e lembrarei amanhã...
Hoje, ontem, amanhã
Ontem, amanhã, hoje
Onamatem nhãhoaje.
Olhei pra lâmpada um milhão de vezes
Antes ela até se mexia
O silêncio tinha um gosto diferente
Mas não sou só eu, antes
Mais coisas acontecia...
O futuro está no cigarro
Não o queime apenas
Não transforme esse cigarro
Em um câncer estúpido e só
Eu vi o sol hoje e ele nunca me pareceu
Tão vazio
E sei que nele há segredos tão singulares
De deixar a vida por um fio
Como é a eternidade uma lâmpada
Para um mosquito.


Valéria Dusaki

segunda-feira, 31 de março de 2014

Nó e laço

Estou roubando sua alegria
Como quem picota lindas poesias
Em nome de um segredo
Que deveria estar aos quatro ventos
Sem estar em frangalhos.
Eu te expulso para que fiques
Eu te grito pra que me escutes
E tudo se resolveria com o abraço
Que não ousaste receber...
Estou perdido como os que rezam
E observam além da cruz
Porém perdido como os que pedem
Perdão pelo pulular do pus
O perdão não vem do flagelo
Se ele é auto e consciente
Se a loucura é clara pro demente
A redenção e a via-crúcis perdem o elo
Seu segredo não está bem guardado aqui
Senha fácil e a vontade de fugir
Grito, expulso, e o segredo do abraço?
Os mil nós ocultaram o nosso laço.

Medo do Caralho

Tem um caralho na minha boca
Me impedindo de falar
É o meu próprio.
É um aperto da porra me fazendo vomitar
Nada amendoado ou perolado
É a menstruação sêca na boca
Mas só sangue sem corrimento
Planeta Terror sem gostosa de perna-de-pau
Me perdoem os puristas mas isso é poesia
Me perdoem os turistas mas a copa é uma merda
Tão grande quanto a véia que caiu de uma maca de hospital público
Dois olhos roxos e o respeito murcho.
Murcho feito suas muxibas.
É um caralho-medo...
É um medo do caralho.

"Dia Chuvoso"

Rostos estranhos
Vidas mortas
Portas abertas
Porém fechadas mesmas portas
Blusas de couro de cobra
E guarda-chuvas de sobra
Frio na pele e no olhar
Nas pernas e no caminhar
Olhares olhando o nada
Dentro do tudo das lembranças
Dos pés à cabeça encharcada
De chuva e dança de crianças
Favela alagada
Favela de sonhos
No meio do escombro
Uma rosa intacta
Esquinas erradas e a certa
É sempre na próxima esquina
De mini-saia a menina
O frio esquenta suas pernas?
Horizonte de prédios enevoados
Névoa de horizontes prediais
Sensações de frios infantis
Que sempre voltam nunca mais
Arrepio de uma brisa gélida, cortante
De um dia de sol.


Valéria Dusaki

quarta-feira, 26 de março de 2014

Refluxo

Fluidos sexuais penetrando
Ruídos primitivos só zunindo
Motores estão esfriando
As abelhas da colmeia estão saindo
As personalidades se despersonificando
Os personalistas se despersonalizando
E ficando iguais como os dias ficaram
Depois que as explosões do sol esfriaram

Refluxo da Vida
Refluxo da Morte

As ondas do mar para dentro
O corpo que quer um veneno
O feto que quer nascer feto
O Burro que sonha em ser coruja
O padre agora quer ser filho da puta
Os demônios querem voltar para o céu
Os hippies cismaram com a armada luta
E os punks querem evitar o escarcéu

Refluxo da Vida
Refluxo da Morte.


Valéria Dusaki

segunda-feira, 24 de março de 2014

Labareda

Eu quero que a labareda me consuma
Venha, me devaste e suma
Pois enquanto há vida há a centelha
Pura, nanométrica e vasta, pentelha
Pentelhando a pélvis da alma
Pentelhando a inércia da calma
Desconstruindo e reconstruindo as faunas
Dos milhões de bichos a se soltar
Não sou eu que solto, eles se revoltam
Não é minha culpa a tétrica revolta
É a vida se masturbando pra negar sua essência de dor
É a guerra das essências
O riso eterno escondido na maledicência
Vamos, não se deixe enganar
Pela falta de potência
Logo você tão potente em falhar
Usando todos os músculos a bradar seus erros aos quatro ventos
Se cortando pra sentir a força nos remendos
Logo você, tão útil quando se fala em inutilidade
Inverta os vértices
Contamine os clérigos
Em favor da santidade...
Que o futuro se instale em mim
Como o presente que devasta e some!

Cabrobró

Seu filho da Prússia
Vai pra puta que Brasil
Vou ter um ataque austríaco
Meu cazaquistão não agüenta mais
Só Canadá, vou pra república
Domínio-a-cana
Rezar pra São Paulo, São Luís
Santa Catarina e encontrar
La Paz. Preciso de La Paz, meu La Paz!
Negócio da China o Caracas,
Rússia que Paris!
Fico unido, mas no estado que estou
Só com Ilha Grande e Chechênia,
Não agüento mais tomar no Kosovo...
É tão Londres onde quero chegar
Quem sabe eu chegue no fim (lândia)
Antes de ficar Tan-Tan (zânia)
A lis é boa mas só fico na Berlim (da)
Com meu Cabo Verde esperando pelas Amazonas
Na Ilha Bela. E já nem penso mais
Em Ti, Bete. Depois daquele de Írã,
Você com seu sorriso de Iraque,
Falei pra mim mesmo: "Vai,
Pra Rua-anda, não vá fricá".
E não sei onde estou, acho que vou
Pra Cabrobró.


Valéria Dusaki

Os pássaros, a janela e o cantinho escuro.

Tenho tentado seguir a reta
Da retidão
Ou ao menos forjá-la
Nessa imensidão
De futuros tão imprevisíveis
Quanto estáticos
Tal como saber da morte
Mas não sua tática

Tenho te olhado dentro de mim
No seu cantinho
Me importei em ornamentá-lo
Quadros lindos
Agora amarelados
Pois seus olhos os mantinham quentes
Quadros lindos, lindos quadros
Para sempre amarelados

Sou dois pássaros suicidas
Se jogando da janela
Um, a voar a vida obriga
O medo e a inevitável esperança dos alados
Coçam suas asas
O outro com os céus briga
Da coceira se cansa
Na liberdade da queda se enlaça.

sábado, 22 de março de 2014

Ornamentos

Nesses dias frios me assaltam nuvens de passado
E se eu tento correr
Elas me perseguem como se estivessem do meu lado
Me ajudando a vencer
Esse frio imenso e em lembranças fico embalsamado
Quente-frio-deprê
Flores do passado ornamentam murchas covas rasas
Decadentes corpos ainda adubam sonhos bem distantes
Sonhos do passado, sombras, almas preenchem minha casa
Como as pessoas que de longe parecem gigantes
Estão indo embora
Imagens de mortos
Palavras de lápis
Quadros de grafite
Como brasa n'alma
Quem sabe um dia
Com a crença vire
Brasa-alegria.


Valéria Dusaki

quarta-feira, 19 de março de 2014

Amor do Zé

Eu quero sentir o amor
Eu quero ser o
TOM ZÉ.


Valéria Dusaki

quinta-feira, 6 de março de 2014

Meu Amor

Boa noite, meu Amor
Tenha calma
Que na dor de existir floresce a grandeza da alma
És a vibração das batidas desse meu cansado coração
És a quentura vermelha do meu sangue
És a atenção que o vermelho desperta nos olhos famintos
Da paixão.
Eu sei que só você vai ficar
Eu sou o céu que cairá
E você, a eterna poeira estelar
A intenção máxima que cada beijo verdadeiro leva...
Descanse
Tire umas férias de mim
Eu sei que exijo demais tentando matar o que não tem fim
Como um livro que a cada leitura vira outro
Sempre maior.
Continue tentando sair
Resguardando-se em seu quarto
Como aquele que só entende o útero depois do parto
Alguém que aprende de cor.
Pois eu te amo, meu Amor.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

"Uma ode ao Neguinho: parte 1"

Eu sempre brigo com o Neguinho quando eu abro o portão. Neguinho é o meu cachorro. Ele sempre sai espivitado em direção à sua liberdade. No caso, o portão.Às vezes quase lanço palavras de ódio e ressentimento contra a porra do portão, pois acho que o portão quer me roubar o neguinho.
O Neguinho sai, dá suas mijadas territoriais e volta. Mas teve uma vez que achei que ele não iria voltar. Voltou três horas depois com o rabo entre as pernas, todo molhado (no dia estava chovendo. Tivemos que levá-lo ao veterinário, ele ficou internado, e além do peso da preocupação o bolso também pesou: entre remédios e internação a conta deve ter ultrapassado uns mil contos).
Além da preocupação com ele (amo muito o Neguinho. E olha que nem é pela exclusividade do amor dele por mim, afinal ele é um vendido, abana o rabo pra todos os meus amigos e amigas que vêm aqui em casa. E ele é um macho safado, minhas amigas e minha namorada que o digam. Ele é um cocotinho melindroso perto delas), me preocupo com as pessoas na rua: deus me livre o Neguinho atacar alguém, isso me mataria. Por extensão ele estaria me atacando também, afinal se ele fizesse isso seria por responsabilidade minha, por eu não ter brigado o bastante pra ele não sair, e se ele saiu foi porque eu não dei todo o carinho que ele queria, por isso ele procurou outros territórios pra mijar, outros seres vivos pra descontar toda sua frustração crescida da minha inutilidade em fazê-lo feliz na nossa casa, e por isso ele foi afogar suas mágoas no meretrício, nas brigas de esquina e nas mijadas baratas da zona da cidade. The guilt is a bitch...
Mas hoje foi diferente: minha mãe ia sair e eu fiquei fazendo cafuné no Neguinho pra mantê-lo perto de mim e o abestado não sair pra sua orgia de sexo e violência nas esquinas da cidade. E enquanto o acariciava fiquei pensando no que é o amor: amor não é cuidar, amor é amor. Cuidar é a expressão do amor e sua potencialização, pois quanto mais você cuida, mais você ama. Mas cuidar não é ter raiva do portão, isso é posse, é eu querer ser o portão, o território, as árvores nas quais ele mija, as cachorras com as quais ele cruza, os cachorros com os quais eles briga, as pessoas que ele ataca ou não... isso não tem nada a ver com ele, só comigo. Ele, como cachorro, nem pensa em ser livre: ele é a liberdade materializada em vontade pura. Já eu sou o labirinto da liberdade, livre pra chegar a lugar nenhum, lugar que eu toscamente rascunhei idealisticamente e empiricamente tal qual o mapa pro paraíso, sem saber nem o mapa pro meu coração.
Então me desapeguei: fiquei fazendo carinho nele e quando ele saísse desembestado e eu só chamaria a atenção tentando expressar o meu amor de tê-lo ao meu lado, não o terror de perdê-lo pra putaria da Arniqueira. E aí se fez o milagre: quando abriu o portão ele se aninhou sentado recostado na minha perna. Como se dissesse: "tá bom, Davi, eu te amo. Eu deixo a zona pra amanhã".
O que fazer quando um animal companheiro (e um companheiro animal) te mostra mais sobre o amor do que todos os tratados sobre amor do mundo? Olhei nos olhos dele e disse:"Também te amo, seu cachorro gatuno...".
E então entrei, desejando que esse cão lindo e pervertido pelo menos use camisinha quando fugir no carnaval.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Manifesto do Caralho na Terra da Puta que Pariu

Saiamos de nossas casas. Não é nossa casa. Nossa casa é nossa cabeça, parede-ossos. Janela-olhos. TV-pele. Não é a Dilma. Não é o Bolsonaro. Não é o marxismo de direita pós-hippie conservador homossexual temperado com dendê franco-dominicano... não é isso.
Quando vamos nos cansar de vermos os outros sob um prisma de espelho pervertido? Discussões sempre haverão, e que bom. Não é a perfeição que importa. Mas sim a busca de um carinho pela sua procura, apesar de termos que olhar nos olhos da outra pessoa com a humildade de querermos nos encontrar neles.
Eu simplesmente acho que a ditadura não eleva nenhuma sociedade pois não há uma auto-conscientização (aliás que redundância: ninguém conscientiza ninguém, só mostra o caminho no máximo. Trilhar depende de cada um.). Quem concorda com uma ditadura é encabrestado, e quem diz o contrário é um jumento em dobro, pois é um jumento hipócrita (e coitado dos jumentos...). E foda-se se é ditadura de direita ou de esquerda, não importa. A evolução só está na liberdade. Mas liberdade não existe sem informação livre. A ditadura não esta nos exércitos, tudo existe primeiro no campo das ideias, e por isso em qualquer ditadura a informação controlada é a maior arma. E o pior algoz.
Chamem isso de romantismo, cristianismo, anarquismo, vontade de dar a bunda, teorizem com algum conceito que alguém ouviu dizer por aí. Ou sejam cínicos: o cinismo realmente é a melhor forma de ser impotente mas com uma máscara interna de orgulho hipócrita. Mas a verdade é que se não nos dispusermos a olhar os nossos semelhantes sem amarras, sem preconceitos, sem esse medo plantado pelos jornais e pela luta de classes estúpida capitalista-comunista-ista-ista-ista, sinceramente a barbárie só vai se consumar mais e mais até vivermos numa sociedade onde eu mato sua mãe pra que sua raça não se prolifere. E qual é minha raça mesmo?
O caminho é a arte, a sensibilização. E se quem reclamasse dos marginais fosse num presídio fazer algo de bom, ensinar algo, que tal? E se na empresa que trabalhamos fizermos um clube de leitura? “Não, porra de clube de leitura! Quero é cachaça e arranjar alguém pra meter (ou pra dar)...”. Estamos todos no mesmo saco. Fudeu. Só que o simplismo da dicotomia é a melhor arma pra gente burra. Por que será que Hitler elegeu os judeus como arqui-inimigos? É mais fácil pra um povo sem autoestima e em recessão ter um alvo e pronto. Pra que maiores explicações? É mais fácil a classe alta poderosa usar a classe média vaselina pra atingir a classe baixa idiotizada: seu alvo. “E eu lá vou pensar no marginal? Antes que ele pule o muro da minha casa eu controlo o Estado e a polícia pra ele nem ter a chance. EU conquistei isso. EU trabalhei”. Aí o marginal diz: ”E eu lá vou pensar naquele ricaço? Foda-se, entro na casa dele, roubo tudo dele e ainda faço o regaço na família dele. EU que não tenho o que comer. EU que não tive oportunidade”. E o ricaço não tem empregados na sua empresa não? E o marginal não teve nenhuma chance? É a luta de classes. E qual é a minha raça mesmo?
Minha raça é a classe média branca tão reacionária quanto a alta e tão fudida quanto a baixa. But not so much... são as discussões totalmente parciais sobre as manifestações: tem gente que só se importa com o congestionamento que elas causam: “porra, eu trabalho e vem esses vagabundos me atrapalharem. Tem que prender!!!”. Mas quando assistem os casos de corrupção na TV esbravejam: “corruptos filhos da puta!!!”. Ou será que ainda esbravejam? Afinal a rotina de trabalho pode ser a pior das drogas, ainda mais numa sociedade que quanto mais sofrimento o trabalho causa, mais digno é o trabalhador... ecos de uma educação católica que preconiza o sofrimento como forma de purificação.
Vamos escutar música. Ir a shows. Ir ao teatro. Ler livros. E nos reconhecermos neles. E falar sobre isso com alguém no ônibus. Ou vamos bater nossa punheta ou siririca no computador, trabalhar em casa por computador, conversar via Skype com um armênio enquanto nossa mãe morre no quarto ao lado.
Cada um com sua escolha. Eu fiz a minha.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

A poesia morreu.

A poesia morreu.
Esfaqueie a sua mãe
Estupre seu pai
A poesia morreu
Eu morri meu amor
Quando a droga foi mais importante
Quando vomitei o seu sangue
Quando quis só te fuder
A poesia morreu
Viva o nazismo
Viva a China
Viva o capitalismo
Viva a vingança
Pra que amigos? Só quero contatos
Pra chegar em algum lugar
E não ter com quem falar
Só com o que falar
Beber, fuder
Fuder, beber
De vez em quando ver alguém sendo morto na TV
Ou na deep web
Deep shit
Só evite o desespero, evite
A Ivete Sangalo é horrível
Mas se ela abre as pernas eu meto até o osso
Meu pau grosseiro e grosso
Batendo uma punheta vendo a morte na TV
Sexo, violência e drogas
Pra que poesia?
Os vermes saltarão pelos olhos quando morrermos
Que nada, eles já saltam enquanto putrefamos vivos
Mas os retardados que mataram a poesia só conseguem enxergar sangue.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Cada um tem o governo que merece

Filhos da Puta-Estado
Nossas tetas já cansadas
Estão expelindo sangue
Jorrando dessas favelas
Cruéis fudidos escrotos
Votam leis de hipocrisia
O menos ladrão do congresso
É pior do que o pior da periferia
Porque o cria
Ninho de escorpiões
Apoiados pelo povo
Maluf eleito de novo
Suassuna sendo protegido
Pelo corporativismo
Merdas que votam em merdas
Você votou em alguém?
Pois se você votou já era:
Você é um merda também
Só que tu é um merda fudido
E eles nadam em milhões
Levantou a bandeira do partido
Que vai enrolar seu caixão
E o do seu pai, seu filho, seu neto
Que vão morrer pelo próprio algoz
Classe dominante e governo contra você
Arrancando sua cabeça, seu cú e sua voz.


Davi Kaus

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Mania de lavar as mãos

E essa mania de lavar as mãos?
Lavo minhas mãos pro que eu sou
A sujeira não vai embora
Nem o perfume.
Do estrume vem a rosa
Do hardcore vem a bossa
Do caviar vem a bosta
A facada em lindas costas
Ah, essa minha mania de lavar as mãos
Vem da culpa inata dos cristãos
Que quase passa no orgasmo
Que quase desata o ínfimo laço
Que mistura o prazer e a traição
O laço que ata o amor à vaidade
O grito de socorro ao vão alarde
O bom sermão e a maldade
Ah, por essa inútil e linda poesia
Lavo minha mãos...

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Vida definitiva

Eu quero sangue e suor
Morrer andando, lutando
Você estava feliz e sedado quando te vi
Atirando-se num futuro escolhido
Por outrem. Ontem.
Os latidos te incomodavam
O relógio te enfrentava
E você passivo, passado, pasmo, pateta, podre
Você estava dormindo acordado quando te vi
Falando sobre sonhos como quem sonha
Falando. Descrevendo na inércia
A imaginação pungente (imaginação)
Amanhã foi legal comparado com
O ontem que o hoje é. Segundos pra trás
Minutos pra frente hora parada
Caminhada na esteira da indecisão
Minha. Milhões de quilômetros, passos
Firmes em direção à cova.
Eu sei o que é uma poesia definitiva
Eu sei quando ela agride minhas células
Conjuntivas e minhas
Gengivas sangram pois não posso mais
Comer (sem viver)
Viva a vida que começa a partir de agora
(03h:07min e 30s).


Valéria Dusaki

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

O Mundo me telefonou hoje (anti-soneto)

É um cinismo disfarçado de justiça
O desespero embebido em pinga pura
A cocaína que o nariz fudido cura
Invertendo a culpa certa mas furtiva

É o rock and roll sem alma que me deixa surdo
Impregnando até a ponta dos meus dedos
Tornando minhas sagradas vísceras sonetos
Mais falsos que essa política do absurdo

Verdades empedradas nesse inconsciente
Mais factual do que um tiro na sua testa
Porque nem uma bazuca quebra a crosta-creme

De gente que não vê o espelho, essa gente
Nas quais me incluo pra me excluir depressa
Como uma puta que não goza porém geme.


Davi Kaus