terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Pureza (de comercial)

A criança no comercial
De uma empresa pós-neo liberal
Que escraviza crianças como ela:
Talvez seja como acender uma vela

Que os empresários-crionças acendem
Pros telespectadores acreditarem
Que tudo aquilo que aqueles vendem
Tem a pureza das crianças que nascem

Sem ser na FEBEM
Sem ser ao além
A leis de ninguém
Só do carpe diem

Quando apaga-se a luz e fica tudo um breu
Breu de não saber às vezes quem sou eu
Ergueu-se um muro de torpor escuro
Simples: sem presente, passado ou futuro

Mas de repente as pupilas se abrem
Sombra e luz se revelam em alguns segundos
Vem a pureza das crianças que nascem
Como esperança vindo ao mundo e pro mundo.


Valéria Dusaki

"Mais uma jarra de vinho"

Hoje é a noite mais fria do meu mundo
Hoje é o poço mais fundo do meu fundo
E do fundo do meu coração
Não me sinto mal.

Hoje o meu sangue se transforma em vinho
Hoje me sinto assim tão pequenininho
Como uma pessoa simples e sozinha
Não me sinto mal.

Meu bem, não se preocupe
É só um surto, me desculpe
Mas é que eu quero andar
Como alguém que não se desculpa
A lua me acompanha
Cada um tem suas manhas
É só poema de botequim
Mas eu me sinto exatamente assim.

Eu te amo, amor, eu te amo
E me preocupo
Eu te amo, amor, te amo
Não é só um surto
Hoje vai ser engraçado
Facas, explosões e gritos
Estou brincando, meu amor
Eu juro, juro que consigo
Ir pra casa.


Valéria Dusaki

Anarkos

Ela estende a mão ao padre
Ele diz pra olhar pra deus
Ela estende a mão a Deus,
VAZIO;
Ela estende a mão ao traficante
Ele a corta. Sobra a esquerda...
E ela estende a mão ao punk
Ele cospe nela;
Ela estende a mão a um comunista
Ele fala, fala, fala e vai embora.
Ela estende a mão a um capitalista
Ele põe uma nota de cem!!! Mas é falsa...
Ela estende a mão ao George W. Bush
Ele a bombardeia, mas vaso ruim não quebra...
Ela estende a mão a um político qualquer,
Ele fala, fala, fala e vai embora com sua touca.
Ela estende a mão a si mesma:
Chora, trabalha, se casa, tem filhos e
Morre com 97 anos, 3 meses, 1 dia, 4 horas,
3 minutos e 00 segundos
Afinal, com 14 anos ainda havia muita
Vida pela frente!


Valéria Dusaki

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Ainda presente

Queria saber quando essa vergonha
E essa vontade de revanche vai passar
No cérebro as lembranças medonhas
Insistem em não quererem cessam

No meio de um verso de amor
A tinta se transforma em sangue
Caneta é faca e o escritor
É a vítima fácil, exangue

Como num suicídio.

A revanche tinha que ser contra o relógio
Mas sendo o tempo abstrato, e nós
A sua personificação, me elejo o lógico
Alvo da minha vingança tão atroz

Talvez seja o meu superego culpado
Mas como um animal não deveria ter deixado
Pois o ID de um animal prefere a sobrevivência
Ao prazer, mas o ser humano comete antinaturais
Demências

Como um suicídio.


Valéria Dusaki

Filósofos dos versos

Sentidos que migram de um pólo ao outro
Do mar. Sons nefastos de uma brisa etérea
E as confusões continuam...
Essas antíteses quase cansam
Mas continuo a cometê-las por força
Do sentido da vida que elas expressam.
"Roubos e mortes
Fracos sustentam fortes
E mesmo assim são considerados fracos".
Ah, quase o tom levemente rosa do crepúsculo
Virou rubro. As ninfas do sono me afagam
Em meio ao bosque predominantemente
Multicolor e eternamente ensolarado
Pedras refletem o irreflectível. E tudo isso
São sensações discretas e avassaladoras
"Prostituição infantil
Sanguessugas humanos
Esperança apenas para masoquistas hipócritas".
Quem deveria vencer:
Filósofos ou poetas,
Caminhos ou as metas?
Subvertamos a lógica dessa poesia
Troquemos a noite pelo dia
Real misturado pela fantasia.


Valéria Dusaki

Com pé sem cabeça

Quero chegar perto do sol
Mas se ele me destruir?
Quero permanecer em formol
Mas quero ter pra onde ir

Meus pés flutuam em cima da minha cabeça
Porém ela dói pelos seus descaminhos
E talvez sempre andem em desalinho
E meus pés se machuquem antes que eu veja

Como alguém que no final da vida
Pensa em mudar de vida
E só pode mudá-la pra morte
Não será melhor ter a ferida
Pela escolha assumida
Do que apenas contar com a sorte?

Pessoas vivem sem beijos
Como pescadores no mar
Famintos só por receio
De ir à luta e o barco virar

Nossas procuras nunca levam à perfeição
Mas eu prefiro a diversão de procurar
Noites vêm e os corpos se aglomeram no chão
E o mais surrado é o que atrai mais o olhar.


Valéria Dusaki

terça-feira, 13 de novembro de 2012

"Fim"

Eu queria ser seu sonho
Mas você quis acordar
E também quis ser seu sono
Mas você não quis dormir
Eu quis ser a sua vida
Você pensou em se matar
Eu quis curar sua ferida
Mas fiz o sangue sair.

Eu quis esquecê-la um dia
Querer não é conseguir
Prometi, tudo faria
Pra estar com você ali
Mas você não me quis lá
Preferiu um outro alguém
Quando quis alguém pra amar
Fiquei só eu, mais ninguém.

Desculpe-me por gostar
Tanto de vê-la sorrir
Mas em vez de animar
Vi a lágrima cair
Mas o tempo irá dizer
O que eu tanto quero ouvir
Mesmo apesar de querer
Que você estivesse aqui.

Davi de Carvalho Barros
3º ano-turma B
Poema integrante do livro "Canção das Palavras"
Centro Educacional Católica de Brasília
2000

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Dor

Ela vai me esquecer
Vai florir em seus olhos
E eu vou querer pisar com ódio imensurável
Nessas rosas de amor
Que eu não cultivo mais
É assim: o tempo mata
Não há mais esperança pra mim...
Dez anos juntos
E a eternidade só
Eu não consigo mais amar...

sábado, 25 de agosto de 2012

Lá e aqui (e acolá)

Tenho estado cansado
Entre o sol e a chuva
A profana e a pura
Busca da verdade. E a verdade é que...

Tenho estado cansado
Entre a globalização dos sonhos
E a globalização da selva e
Nessa aldeia o pajé é o Bush...

E o que restará com certeza não serão árvores
Bush quer poluição armamentista
Quer deus, pátria, família e mortos árabes
Bush quer os Estados Unidos como uma ilha
Lá na lua pra quando o mundo ir pros ares
Ele rir do mundo árabe, que pra ele
É o mundo inteiro

Tenho estado cansado
Entre a vida e a morte
A bondade e o bote
A saudade e a estrada
A comida e a cachaça

Tenho visto de tudo
Vi a queda do muro
E a alta do dólar
Vi a alta dos juros
E o final da sola
Do sapato sem emprego
E sem esmola

Vejo a solidariedade como a única saída
Mas ontem o carro bomba matou mais uma família
E o Ariel Sharon fudeu mais uma mesquita
E o George W. Bush com sua política nazista
Convenceu o seu povo que essa é a única saída.


Valéria Dusaki

Paz?

Mais um plano.
E enquanto ele for considerado como um plano
Nunca sairá do papel
Pois, de um plano,
É a essência de não sair do papel um ponto
Como essas nuvens do céu
(Que não como).

Mas é real
Toda angústia e desesperança que um plano causa
Elas são dinâmicas.
Como braile
Nas pontas dos dedos dos sonhadores, da alma
Que instiga as glândulas
(E as irritam só).

Só? Não apenas, há penas...
Irritam glândulas d'alma
E pessoas fazem cenas
De um filme que nos fazem coçar
As glândulas lacrimais

Filmes! Essa poesia!
Deixe-a sair do papel
E como da revolta, filhas,
Faça arte subversiva
Escreva escarcéu: escarre o céu
Escreva governo; engov-ermo
Escreva sentimentos: simtormentos
Escreva paz: paz (E não só escreva,
Senão você só escrava).


Valéria Dusaki

Céu solitário das cidades

Ninguém quer ter a resposta por si
Todos querem algo pra seguir
Pra pôr a culpa no sol pelo anoitecer
E sentir humildade ao vê-lo nascer
Pra se algo der errado
Todos olharem pro lado
E quando o sinal vermelho vem
Todos pensam que a vida seria melhor
Se todos andassem de trem
E todos pensam sem pensar, e só
Não quero ser só mais um, e ninguém o é
E isso faz todos muito parecidos
Tem gente que não duvida e agarra a fé
E tem gente que não sabe se usa calça ou vestido
Mas a fé indiscriminada pode esconder algo
Como um sorriso com uma pedra no sapato
E a dúvida ser o céu de janeiro de 2005
Totalmente diferente do de janeiro de 85 ou 2025
Eu sou medroso e preguiçoso
E procuro o céu dentro de um poço
É trabalhoso olhar pra cima
E perceber que sempre há clima
Favorável pra vê-lo, voar e tocá-lo
Como é difícil abrir meu coração
Só é permitido em igrejas e consultórios
Como é difícil ultrapassar as visões
De corações tristes porém risos eufóricos
Como é difícil ter que ganhar dinheiro
Valendo mais que isso.


Valéria Dusaki

"Rostos sem gargantas"

Obrigado por dizer obrigado
Por me ver atrás dessa nebulosidade
De coisas coloridas até o talo
Mas que tiram da raiz profundidade

Obrigado por ver minhas lágrimas
Descreveram-nas chuva nesse sol imenso
Me falaram das suas senhora-de-fátimas
Sem me tocar, nenhum carinho de alento

Não quer saber meu CNPJ?
Desculpe, esqueci meu RG
Tudo se resume a esses soluços

Cadê você, peraí, não há portas...
Mais uma ilusão do anoitecer
Mais um verde-metano-vultos.


Valéria Dusaki

Pessoaços e maquinalmas

Nasceram mais casas
E demoliram pessoas
Essas pessoas com nervos de aço
Coração de pedra, cara de pau
E alma de vidro...
E a cidade está doente precisando de atenção
E os parafusos das cabeças espalhados (as) pelo chão
Nos dizem que o mundo está louco
Os apitos das fábricas estão roucos
E as pessoas trocam o óleo
Põem combustível e mesmo assim
Entram em pane
Os carros dirigindo pessoas sem freios
As estradas fazendo lipo pra acentuarem as curvas
E parando o trânsito
Nasceram mais casas
E demoliram pessoas
Essas pessoas com nervos de aço
Coração de pedra, cara de pau
E alma de vidro
Que todo dia se quebra,
Mais um negócio lucrativo.


Valéria Dusaki

Sozinho sem mim

Sangre na alma
Morra na calma
Sua maquiagem está borrada
E sua cabeça está drogada

Triste e distante
Mesmo ali adiante
Como a mais perfeita cidade
Como o mais silencioso alarme

Veja, passou
Se foi e amou
Como o amor novo e senil
Você é o único depois de mil

O rei se vai sempre
E você é o filho
Algo bom que vai ser ruim
Enfim sozinho mas sem mim

Pedir a verdade
E se assustar com ela
A procissão que incendeia a cidade
Por causa das preces com as velas

Drogas pra sentir
E ficar dormente
Almejar a liberdade em fugir
Tendo que viver secretamente.


Valéria Dusaki

Pedra nas screaming whores

Imagine uma pedra
Uma pedra no sapato de Deus
Mas, agora, uma serra
Uma serra no sapato, no seu

Justamente o que Kant me disse
Já me disse, então esqueça
Antes ele me visse, e me visse
Com serpentes na cabeça

Ele teria virado pedra.

Quero sair do mundo
Então apenas olho pra dentro
E vejo screaming whores
Com suco de abacaxi noite adentro

Justamente o que Nietzche me disse
Ficou dentro aqui enjaulado
Antes ele me visse, e me visse
Com serpentes do seu lado

Ele teria virado pedra.


Valéria Dusaki

Tortura

Vozes enevoadas pelo medo emudecedor
Eles não sentem frio nem remorso, não há dor
Desaparecendo, um a um, todos seus amigos vão
Os portões se fecham, as covas se abrem sobre o chão

Verde, amarelo e vermelho
Menos branco, bem mais negro
Sinta o beijo virar tiro
E o amor virar vampiro

Esse é o desespero do animal à beira do abismo
A sensação que você nunca queria ter sentido
A caminho do abatimento por mãos bem treinadas
Que sabem mui' bem como ser indolores ou sádicas

Anoitecer do amor
Amanhecer da tortura
Ora na tarde indolor
Ora na noite mais dura

A idéia de lutar contra isso foi nossa, então
Como fomos capazes de tamanha surdez em vão?
E agora as lembranças mais lindas são as piores
Pois agora é só morte, sem sorte, apenas os cortes

Feitos por inimigos
Que sabemos quem são
Que mesmo sendo antigos
Parecem sem solução.


Valéria Dusaki

Muros ao poço (*)

Era só concreto e pensamentos tristes
Um presente inerte, como se apenas visse
O azul depois cinza depois vermelho
Projeções lógicas diante do espelho

Era só o vazio cheio das lembranças
Que nunca aconteceram, mortas nas lanças
Do muro grandioso da mais linda mansão
Sonhos lindos, mas quase na realização

Mas, de repente você
Mudou o rumo ao precipício
E eu, quase sem poder
Acreditar que havia resquícios
De amor.

*Título dado por Higor Sofiery


Valéria Dusaki

06:15

Tem horas que a hora não passa
Cada minuto é navalha
Nada que pague, que valha
O sofrimento que isso causa

Segundos martelam na mente
Segundos sempre primeiros
Iniciais desesperos
E fortes, incessantemente

Os olhos tocam o sono
O sono cerrando os olhos
Mãos do padre na extrema unção

Ouvidos já escutam mono
O "espera" escutado "logo"
Os passos são bombas no chão

Zona de zumbido, usina
Sonhos que se tornam sinas
Cochichos que chamam chamas

Chamas que trazem aconchego
Chego lá mas eu não chego
Meu corpo em pé já é cama.


Valéria Dusaki

Boite ou pogo (?)

Um nome na noite
Um banho na boite
Um maço no açoite
Um corte no coito
Oitenta ou oito
Afim e afoito
Arranhos na rua
Souberam da sua
Insensata incensura
Flagrante do fogo
Apagou-se o pogo
Apossaram-se do poço
Recavaram a cova
Reviveram o (in)vão
E um nome na noite...


Valéria Dusaki

Perdão!

Você se esvaindo em meus braços
Afogando-se no seu choro
Eu digo, digo, mas não faço
Sentidos velados em coro

Eu não nasci pra me enganar
Mas tem horas que o inferno
Ë mais fácil do que pensar
Que o amor você faz eterno

"E se for posse, não amor?
E se for pena, não carinho?
E se for culpa e não vontade?
Obrigação sem ser saudade?
Se for só medo de ser só
E não vontade de ser dois?
Ou apenas um momentâneo nó
Que se tornará cego depois?"

Você perguntou se era sim
Sabendo ser não ou talvez
Eu fui sincero, mas vim
A me assustar com a tal vez

Que o talvez era sempre, sempre
Vai ver o egoísmo demente
Me fez pisar nessas sementes:
As lembranças que fazem a gente.


Valéria Dusaki

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Quem sou eu?

Eu tenho saudades do tempo
Que eu não sabia que o tempo
Era o tempo; espera, me dá um tempo...
Quebrem os relógios e se tornem
Combustíveis dos seus sonhos mais
Medonhos, suponho que essa seja
A melhor saída pra quem pensa
Que não há saída, como eu...
Eu sou alguém só pra mim
E pra quem quiser me entender
Como eu. Ah, não me entenda mal
Ou bem, estou muito cansado
Pra tentar me entender, quem dirá
Me explicar... Minhas imagens são tão
Inconscientes que eu tenho raiva de
Froid (ou Freud...).


Valéria Dusaki

Sucexo

Que sucesso é esse
Que é um retrucesso
Que é um cessar-fogo
Que é sem sal, insosso
Que sossega o sono?

Que sucesso é esse
Que penetra o peito
E putrefa o puro
Purifica o insano
Não mais porra-louca?

Se é assim a fama
Quero ser infame
Quero que inflame
Esse machucado
Quero ver em chamas
Esse seu chamado

Se eu for enlatado
Quero ser veneno
E não doce de leite
Nada de sereno
Se eu for fabricado
Quero ser uma bomba
E que tudo se foda
Que tudo se exploda.


Valéria Dusaki

Lua nova antiga

Às vezes bate um desânimo
Penso que não tenho amigos
E que nada vale a pena
Penso em me jogar no vício
De me jogar em vícios

É passageira essa coisa ruim
De pensar que estou sozinho
De pensar que quando vier o fim
Na vida dos outros terei sido só um espinho
Um incômodo pequeno e tão grande

Na noite todos parecem gostar
Mas e no dia? É aí que se prova
No céu do dia estrelas não há
E á noite há estrelas de sobra
Você tropeça em estrelas toda hora

Tanto faz e não tanto faz
Não, eu me importo.


Valéria Dusaki



Sentir vivo

O que te faz sentir vivo?
O que te dá arrepios?
Aquilo que te faz gritar por dentro
Aquilo que não se vai com o vento

O beijo que acelera o peito
O medo que te parte ao meio
A morte contida num copo de destruição
Destruir-se para assim sentir o coração

Apenas uma simples brisa
Num rosto em fogo que anuncia
O prazer que deve voltar ao seu lugar
À vida, que deve sempre semeá-lo

O que sua pele te pede
Para resistir ao concreto?
A quê tua pele te impele a fazer
Para o elo entre ela e o coração não ceder?

O som que me faz perder a respiração;
Os olhos que me fazem ficar sem ação;
As ruas que me fazem querer andar nelas:
Aquilo pelo qual eu rezo e acendo velas.


Valéria Dusaki

Caindo

Tudo está tão vazio
Nem calor nem frio, só torpor
Não há nada mais, tudo é nada agora
Só o passar das horas

Nem escuro nem claro, só opaco
Vegetar é tudo que eu faço
Não há mais motivos pra continuar
Só o passar das horas

Como um fim de tarde, transição
Uma flor esmagada no chão
A beleza e o ódio, a tristeza e o ópio
Nada se define

É um desespero controlado
Um dia chuvoso ensolarado
Entre a vida e a morte, dentro de um caixão
Nada se define...


Valéria Dusaki

Veias (visão infernal)

Silenciosos eles vão
Por entre a cidade morta
Olhos longe da aurora
Das púrpuras pueris horas
Rumo a outra estação
Silenciosos, simples vãos

Dedos rijos, expressões
De dor, rumo ao céu doente
Dor, mais dor. Mas dor dormente
Dor que não vira semente
Olheiras, olhos-sertões
Secos, de mil solidões

Veias roxas vejo em mim
Pelos olhos fui fisgado
Mas meu coração acuado
Se fez presente e acordado
Depois do iminente fim
Voltei a ser sol assim.


Valéria Dusaki

Poesia para os derrotados

Quando você quiser mudar
E achar que é muito difícil
Pense nos bóias frias
Que morreram
Nos canaviais:
Mortos de exaustão.


Valéria Dusaki

Ódio

A única razão pra eu querer
Te beijar é querer sentir nojo
Pra vomitar na sua boca


Valéria Dusaki

Salvadordenenhumlugar

Visões oníricas: falo de anjo
(A-hãm: falos de anjos)
Seios de Deusa, decido
Vou descendo e já descido
Rosa e língua e olhos azuis
Sol ao sul, completa Deusa
Pensei em ir e já fui
Como as velas na mesa
Flutuando às quatro da manhã
Num céu que inspira o afã
Nuvens curvas de crepúsculo
Vôos oníricos: sei os de anjas
Asas cor de crepúsculo
Vermelho-fogo, amarelo consumindo
Como o príncipe e a princesa indo
E eu ficando. Distante
Alma e corpo juntos e diante
Um do outro, porém sem reconhecer
Um ao outro. Realidade onírica?
Idílio esquecido? Caos
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Valéria Dusaki

Substâncias mortais

Há uma onda negra em meus olhos
Substância mortal em meus poros
Exalo vontade de morte geral
E mesmo ao contrário de um animal
Com a mesma avidez quero me matar
E me calar

As solas dos sapatos escondem segredos
Como na minha mente escondo meus medos
E sonhos macabros soam freudianos
Verdade reduzida a sonhos insanos
A dor de cabeça, quem dera ela ser
Dor de morrer

Tento acreditar na bondade e no amor
Mas tudo me força a ser um escroto
Infiel, egoísta, torpe, ignorante
Que é bálsamo o precipício adiante
Todos querem que eu acredite e cair
Dizem que é a solução pra eu sair:
Dor por sorrir.


Valéria Dusaki

Cruz infernal

A cidade acorda, escrava de si mesma:
A cidade, a corda, os corpos pendurados
Vivendo não como um papel que se queima
Mas sim como um gelo exposto ao sol dado

Sol dado aos soldados que não têm o sol
E que sem o sol morreriam de frio...
Porém mesmo no sol eles vivem em formol
Somente agüentando a inconstância do fio.

O céu brilha azul, mas as almas já mortas
Assim permanecem, no fim ou na aurora
De dias tão lindos, mas que poucos vão
Olhar não com os olhos, mas com o coração

São vultos, espectros de alguém que um dia
Sonhou em lutar pela sua alegria
São sombras de vidas que antes tinham cor
Mas que preferiram acreditar na dor

Na dor que não ensina, a dor assassina,
Na dor que ao invés de ajudar, é uma sina:
Uma cruz estúpida, cruz infernal
Que diz que é perfeita a ferida no sal;

Cada qual com sua mentira que acalma
O caos fervoroso do corpo e da alma;
O caos que evitamos pra não percebermos
O quanto esse mundo morto é triste, enfermo.


Valéria Dusaki

Casa das sombras

Teias de aranha por todos os lados
Velas apagadas nos candelabros
Quadros nas paredes me causam arrepios
Parece que os olhares não são fixos

O vento na poeira causa arrepios
Mas eu estou sozinho e não fui eu
Ouço um quebrar de vidros
Vejo que uma sombra apareceu

E eu que sou ateu pensei em Deus
O medo que senti do inexplicável
Me fez ficar tão vulnerável
Que o inexplicável sensato pareceu

O clima era tão fúnebre e nefasto;
O medo quase materializado...
Parece que ele estava me olhando
Na espreita, só esperando em algum canto

Nas escadas, panos negros pareciam
Que iriam avançar em mim
Lá em cima, no escuro, vultos riam
Mas eu falei que iria até o fim

Foi quando a casa toda veio abaixo
Me vi sendo levado pelas trevas
E perseguido pelas sentinelas
Da casa que o chão era o telhado.


Valéria Dusaki

Passado

Gozo fétido
Gosto pútrido
De amor. Milhões de banhos e ainda assim
Me sinto sujo.
Vampiros sugaram minha alegria
E a ameaça do amanhecer os expulsou
E fiquei sozinho nessa noite-dia
Transição de alguém que quase não perdoou
A si mesmo.
Culpa fétida
Alma pútrida
De dor.
Toda distância vai ser pouca e a voz
E a voz rouca não se fará escutar
Desenho meus medos em telas ardentes
E o fogo irá consumi-los por inteiro
O pó do carvão se tornará sementes
Dementes-sãs dentro do meu peito.


Valéria Dusaki

Poesia

Não quero apenas escrever poesia:
Quero ser poesia
Quero ser o farrapo emocional
Que, noite e dia,
Sofre aflito e ofegante pelo amor que se foi
Sofre aflito e ofegante pelo amor que dói.

Não quero descrever o mar azul
Sem antes sentir o sal em minha pele
Sem antes a maresia me refrescar
Sem antes olhar o horizonte que segue, segue...

Não quero apenas sentir o que escrevo
E sim escrever o que sinto
Não quero falar sobre furacão:
Quero descrevê-lo vindo...


Valéria Dusaki

Dourada-púrpura

Venha e me faça ver a lua dourada-púrpura
O céu descendo e a beleza sendo cura
Me faça dizer versos multicolores
Te fazendo esquecer todas as dores
Me diga segredos ao pé do ouvido
Sussurre em minha alma seus desejos
Me fale o que nunca foi realmente dito
Me faça acreditar naquilo que vejo
Me deixe desligado, esquecido do mundo
Te faço sentir todas emoções em um segundo
E a overdose seria uma coisa benéfica
Fazendo você deixar de ser tão cética
E a paixão venceria nossos corações
E todas desculpas se tornariam perdões.
E o vento sopra, os lobos uivam
O amor não adianta, dores não curam
Os lobos estão em posição de ataque maciço
Nós seremos nossos próprios castigos
E o seu perdão me fará sofrer
Por saber que meu erro é impossível de esquecer
E a mentira te faria gloriosa
Mas a glória não te salvaria da fossa
E o medo de seus fantasmas internos
Te jogaria num pesadelo eterno
E eu sofreria por te ver tão mal
Assim jogando na minha ferida sal
Tudo ficaria meio turvo, escurecido
E o amor iria embora escondido
Pois a dor faria mal às percepções
E perderíamos nossas emoções.


Valéria Dusaki

Música

Espasmos musculares.
O vento do paraíso soa assim.
Formigações por todo o corpo
Lágrimas e sorriso e espanto
A convicção de que podemos ser deuses.
Como alguém pôde fazer isso?
E é tão simples... É só música
E é tudo isso!...
Me faz sentir cada átomo do meu corpo
Me faz sentir que minha alma tem
Átomos. É falta de educação
Invadir uma alma desse jeito...
Feri-la assim tão cruelmente
Deixando-a seqüelada, com uma cicatriz
Tão linda. Provavelmente quem a fez (a música)
Não a transpôs em partitura;
Provavelmente nunca tocou na Transamérica
Nem 1% da população deve ter escutado
Essa música. E o resto é silêncio
Perto dela.


Valéria Dusaki

Tempo no vácuo

Mortos-vivos se arrastam pelo tempo,
Tormento dos que não o aproveita.
Sedentos por vácuo, os mortos-vivos
Perambulam por entre construções e seitas
Milenares surgidas ontem.
Mortos-vivos sobrevivem em vão
Tentando sentir a dormência dos hipócritas
Sedentos por problemas sem solução
Usando pé-de-cabra pra abrir a aberta porta
Procurando o nariz no infinito.
Mortos-vivos distantes de si mesmos
Pra não verem o que o ontem fez com o hoje
A cara desfigurada no quebrado espelho
Numa mão sua cabeça; na outra, a foice,
O coice nas próprias costas.
Mortos-vivos: vida e morte inúteis
Sob um sol que sempre tanto fez
Diante de uma riqueza enorme e fútil
Toneladas de mercadoria sem freguês
Contas e contos no fim do mês
Mortos-vivos: isso que somos
Com medo da vida o suicídio forjamos
Apenas pra esquecer o que sempre fomos
Vivos, mas sempre com a vida sonhando
E morrendo com a vida dentro
De nós.


Valéria Dusaki

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Festa na Alma

Vai ser uma coisa linda, tenha certeza disso.
O sol vai nos lamber como nunca antes,
As crianças voltarão da guerra
Entoando gritos de amor
E nós choraremos de alegria
Braços abertos
E o vento a estripuliar o coração...
Essa nuvem tétrica e horrível está indo embora
E na verdade nem importa mais
Já nem me lembro do barco:
Eu quero é o cais.
Vou a nado
Sangue a pino
E tão calmo
Tão menino
Mas tão Deus...
Eu nunca precisei tanto de um abraço quanto hoje
E os encontrei (foi mais de um)
Tive o colo da minha irmã
E o honrarei.
Tenho me posto em apuros pra me reconhecer
Tenho soltado os cachorros em cima de mim
Tenho estado à mercê de mim mesmo, à mercê
Estando a crescer só pra chegar ao fim.
Não mais. Não assim.
Vai ser uma coisa linda, tenha certeza disso
E não pra sempre
Mas quando vier
Explosõesdealegriaportodososporossanguelindofervilhandovidafestanaalmafestanaalmafestanaalmafestanaalmafestanaalmafestanaalma...

Chaves e cadeados

Vida: morrer e ressuscitar a cada momento
Apenas pra sentir o perigo mortal rente
E na morte descobrir que a vida, dormente,
Não vale nada só com o marasmo do vento

Que o vento se transforme em tempestade!
Que a coragem signifique liberdade!
O medo se torne prudente e não covarde!

Amor, semente doente intensamente ausente;
Serpente mente. Dormente quente, porém friamente.
Sua beleza se contrasta com seu veneno mortal
E nos dividimos, perdendo a noção do bem e do mal

E no prazer do gozo, a dor se torna pior.
Nas milhões de loucuras, a realidade só.
Nessa melancolia, de mim mesmo sinto dó.

E o frio me faz sentir que você não está aqui
E que o meu esforço gigante me fez pequeno sentir
E que as orquídeas, tão raras, desapareceram enfim
E que você foi embora e eu me senti sem mim.

Dor, me faca crer no seu inevitável suicídio;
Rancor, desapareça e não deixe o menor vestígio;
Amor, me diga o que fazer para não ser mais vencido.


Valéria Dusaki

O Sorriso da Puela

O sol volta a brilhar de novo
O anúncio da morte do corvo
A já preparada cova
Da tristeza e da corja
De pensamentos auto destrutivos
Pois quero permanecer vivo
Pra vê-lo outra vez
Acariciar a tez
Do céu no qual ele nasce:
A morena e macia face
Na qual a sinceridade
É virtude e necessidade
Ando entristecido e ansioso
Mas quando o vejo em seu rosto
Não há mais nada
Além da alegria nata
Meu porto seguro após
Violência-tempestade atroz
Seu sorriso ilumina o mundo:
Pelo menos o meu.


Valéria Dusaki

terça-feira, 15 de maio de 2012

Sente-se

Meu sangue se tornou
Uma ilha, na qual me isolo.
Grandes distâncias percorro
Cantos de amor rebelde entôo
Sentado aqui.
Há silêncio em meio ao caos
Das pedras rolando do céu
Há idéias fervilhando mudanças
Uma linda face sob o roto véu
Sentado aqui.
Cemitérios verticais fazem escada
Física rumo ao firmamento
Com meus sonhos, perguntas e medos
Através dos olhos modelo o frio cimento
Sentado aqui.
Não é desperdício de tempo
Nem novo movimento: apenas estou
Sentado aqui...


Valéria Dusaki

terça-feira, 8 de maio de 2012

Interlúdio

Tudo vai melhorar
(Enquanto isso me arranho
E tremo de vontade de beber
E grito aterrorizantemente dentro de mim
Meus músculos se contorcem)
Tudo vai melhorar
(Afinal falta coragem pra corda
Além do mais a vontade de viver discorda
Apesar de num certo ponto
Olhar pra faca
Por mais tempo que de costume)
Tudo vai melhorar
(De repente teria sido melhor
Viver na mentira morna
Do que nessa verdade que me fode a alma
Arromba meus testículos
Desgraça minha força de vontade)
Tudo vai melhorar
(Enquanto você estupra meu espírito
E quando voltares pra felicidade
Eu, prostrado e rijo como um cão morto
Mas com a pseudo-alma dentro,
Agarrado aos temores que você chicoteou
Na minha mente-hematoma)
Tudo vai melhorar
Mas saí da caverna
E ao primeiro passo na luz
Quebrei as pernas,
As mãos, quando me esquentava ao sol
De um microsegundo perfeito...
Desaprendi a me sentir
Sinto-me ora nuvem intergaláctica
Ora bosta n´água
Divirta-se secretamente
(Até pra si mesma)
Com minha fórmula um
Pra lesma
Quer correr mais rápido que a luz
Mas é lesma
Parece que a loucura ronda
E não entra
E esse interlúdio é o pior... (tudo vai melhorar)

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Renitente

Luz renitente e fraca
Analgésico pra terminais
Dor que não deixa marcas
Pois elas são espirituais
Langor num gozo abismal
Chuva fina e irritante
Ferida no dedo e sal
Quase chegas, porém mais adiante
Pois é dentro o que procuras
E procuras na sua estante
E tenta achar no meio das ruas
E sempre estará distante
Luz renitente e fraca
Analgésico pra terminais
Dor que não deixa marcas
Pois elas são espirituais.


Valéria Dusaki

Morte

Nasço. Caso-me com o tempo
E seduzido pelas possibilidades
Sorrio como criança.
Tempo, de mãos muito afáveis
E sorriso Monalisa,
Diz que o prazer está em tudo
(Mesmo tímido e mudo
Ele também conversou com Freud)
Em meio às descobertas, sinto
Fome. Tem uma maçã
Na cesta de frutas.
MORRO!!!!!!

Valéria Dusaki

"Teorema da Escatologia"

Eu sou só uma puta escrota
Com duas pernas varizentas
Com um grande e cicatrizado coração
Com duas crianças pra matar
E um homem pra deixar
Eu sou só uma puta escrota
Com duas pernas varizentas
Com um grande e sangrento coração
Com duas crianças pra matar porque sim
E um homem pra deixar, porque sim
Eu sou só uma puta escrota
Com duas pernas varizentas
Com um grande, grande coração
Com duas crianças pra matar por tanto amá-las
E um homem pra deixar por tanto odiá-lo


Valéria Dusaki

(Maravilhosa) Fúria

Quero essa fúria
Sentir o meu sangue pulsar outra vez
A porra do sangue na porra da tez
Sangue à flor da pele
Quase pra jorrar
Num esporro de vida
Permaneci sentinela por muito tempo
Refazendo remendos não mais possíveis
Destoando da essência dos poetas incríveis
Destemidos
Precariamente apaixonantes
Apenas apaixonantes
Cresço agora na medida do impossível
As paralelas por fim se cruzaram:
Eu em mim...
Eu em mim...
Eu em mim:
EU EM MIM!!!!!!

Oração

Estava eu
No Pistão Sul
Às seis da manhã
Pensei:
"Que todos esses ônibus
E carros
Pessoas
Estejam indo rumo
Aos mais perfeitos Amores
Das suas vidas."

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Vermelho e quente...para o meu futuro amor

Que meu sangue borbulhe nas suas veias
Que minhas mãos ponham fogo na sua alma
E nas suas entranhas
Que você se sinta estranha
Durante três dias
Me esqueça por dois
E no próximo queira conversar olhando a lua
Que terá se tornado meus olhos
Que eu te faça com você me olhando
E eu retribuindo a languidez da nossa entrega
Tão rígida quanto sensível
Tão idílica quanto crível
Estertor mortal pela certeza da ressurreição
Que eu te machuque de tanto prazer
(ÃÃÃÃNNHH)No meu toque
(HUUUUMMM)Que o enterro
(OOOUNNNN)Me enterre
(AAAAISHH)EM VOCÊ
QUE VOCÊ SE MASTURBE LENDO ESSA POESIA
E GOZE
(AAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHHHHNNNNNNN.................................)

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Credo

Estou derretendo
O tempo é água quente
Como o cérebro dormente
Após tantos sentidos
A alma não vinga
Sou descrente sobre isso
Precipício é precipício
Placas sempre de "não siga"
Quem sabe eu queime a língua
Mas já estarei no inferno
Melhor do que esse eterno
Esperança que cresce e mingua
Mas verdades são assim:
São sempre mentiras no fim
Por só sustentarem-se em mim.

Valéria Dusaki

Seco

Há vidas secas na água
Algo, algas fora de lugar
Tiros certos de mágoa
Na água, sempre a acertar
E cada vez menos
Oxigênio
E cada vez menos
Gênio
E cada vez menos
Ênio
E cada vez menos...

Há algo mais aqui
Como alvos na água
Arrepio que senti
Por sentir a falta
E cada vez mais
Dias
E cada vez mais
Dialetos
E cada vez mais
Dialéticas
E cada vez mais
Dias de dialetos dialéticos diametralmente dispostos.
Cadê você?

Valéria Dusaki

Do inferno ao aproveitamento dele

Penetro nesse antro que é sua mente
Praticamente um pára-raios de devassidão
Concluo, assim, que somos iguais. Então
Deleito-me num parque de diversões intermitentes

E vejo seus pais incutindo-lhe valores
Tais quais cientistas loucos e Frankstein
Lembranças de uma infância onde as únicas cores
São o vermelho-sangue e o alvo-ninguém

Seu primeiro amor lhe pareceu
A redenção que fuzilaria seus demônios
Mas ele apenas te usou e te esqueceu
Foste apenas um poço fétido de feromônios

As pessoas te olhavam no seu canto
Retraída, frágil, submissa ao tempo
Coração feito de carne e remendos
Os quais desalinhavam só olhando

Até que, faltando só uma gota de vida
Pra que a altura viesse ao chão,
Resolveste pegar as suas feridas
E fazer delas sua única redenção

E matou um a um seus inimigos
Com prazer mais que sexual
Por chegar ao espiritual:
Sensos reavivados e infinitos

Não mais aurora, só pôr-do-sol
Só gasto de vida, não mais formol
Sem tristeza, só melancolia
Recuperar o que há muito já não se via

Tens meu amor (sujo, mas amor)
Só um verme pra entender o outro
Não há no mundo quantidade de ouro
Que compre a compreensão de nossa dor.

Valéria Dusaki

Do inferno ao céu

Tudo era névoa, luzes frias,
Sonhos lindos como defesa da
Realidade triste, da tristeza real...
Luzes na névoa são luzes que confundem,
E eu, humano então confuso, ficava
Completamente tonto, sem direção.
A esperança sempre terminava em choro,
O amor sempre como um sonho distante
E os pensamentos tristes cantando em coro:
"Não fale, não sorria, não sonhe ou cante".
Olhava a cidade sonhando sonhos
Sem importância, sonhos em cifras...
Meus sonhos sem realização;
Os sonhos urbanos, vazios e decadentes...
Vidas vazias como vasos
De vidro industrializado em série...
Numa noite qualquer me torno
A depressão e ela me mata, vivos vazios
Iguais a mortos podres, apenas terra...
Numa noite qualquer...
Mas numa noite qualquer você
Apareceu e uma noite qualquer
Tornou-se a noite em que eu me senti
Vivo, completamente vivo...
E depois de mil anos na cova percebi
Que meu coração não tinha apodrecido
Talvez te esperando, sonhando e resistindo
Por ti...Nunca foi tão bom sentir
Meu coração bater.

Valéria Dusaki

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Sinta

Sinta-me quebrando seus ossos
Sinta-me cegando seus olhos
Veja os seus sonhos sugados
Pra dentro dos fracassos
Sinta vontade de fazer
Algo pra tentar esquecer
Sinta a agulha entrando
Sinta os sonhos ressuscitando
E morrendo algumas horas depois
E a dor multiplicada por dois
Sinta o seu corpo inerte
Enquanto sua alma se veste
De luz para ocultar a sombra
Subtração que se esconde na soma
Sinta o cheiro da morte e da dor tomar conta
Sinta o mundo explodindo enquanto você sonha
E o sonho é bom, a realidade é o contrário
A realidade escura enquanto o sonho é claro
E sinta a verdade se revelar no fim
Na verdade você sente o que está em mim.

Valéria Dusaki

Fi-lho-da-pu-ta

O artista é um filho da puta
Da puta mais cruel e negligente,
Ou seja: o público.
Como filhos querem atenção
Ele inventa rimas e um refrão
Ele chora pelas tetas de uma mãe
Que dá para os seus amores passados
Que quase nem estiveram presentes...
Filho bom é filho quieto
No canto de uma sala esperto
Apenas esperando por uma migalha
De olhar. Sofreguidão inconstante
A medida que as migalhas vêm
Porém constante, pois jogadas são
Como ao léu, pra ninguém.
E quando o olhar é de aprovação
O filho prefere o de espanto
Que é mais difícil de fingir
E quando é de santificação
O artista grita: "-Quebre esse santo
Pois é você que deve existir!"
E os dois começam a existir.

Valéria Dusaki

PRAEAMBULA

Este tipo de literatura, sendo desempenhada em prosa ou verso, é incapaz de remansar no esgotamento da palavra ou até mesmo na sobra dela.
Pavimenta precipícios emocionais, desesperos, soluços, canalhices e canduras executados por pura experimentação da linguagem. Invoca curiosos jogos de idéias e verbos, alicerçando a presença da atualmente constante isenção gramatical que fornica de maneira sebosa com o concretismo.
Fora todas estas questões mancomunadas com o imaginário, percebe-se, de maneira marcante, a realidade, favorecendo o discurso que divaga quando quer, mas que cria atrelamento com o verso anterior, dando multiplicidade de interpretações ao leitor.
Não obstante, existem aqueles que adoram situar e rotular livros com teorias ansiosas. Não corro esse risco. Poesia é poesia e, quando sem afrescalhamentos, pode emergir grandiosa, presenteando o autor que acaba recebendo sua sombra em paralelo à obra.
Desta medíocre equação, logo nota-se que é leitura com elasticidade tanto para o banheiro quanto para os academicistas.

Ennio Villavelha


integrante do livro "Poemas de Valéria Dusaki"

Fim de tarde da noite

Como eu esperei pelo sol...
Mas ele não veio, afinal era de noite
Como esperei pelo prazer debaixo do açoite
Como esperei por sentimentos no formol.

A lua estava lá pelo menos
Quase como um remendo, porém embebido
Em bálsamo de licor, contradição sendo
Intrépida e incolor como burro fugido.

Minhas imagens embaralhadas não incomodam ninguém
Mas dizem respeito a todo mundo
Mesmo o mendigo vagabundo e imundo
Sofre e pragueja, assim sendo, contra aqueles que tem
E com alguma razão
Apesar do espírito nada são
(E apesar do espírito, para os outros nada são
Os mendigos).

O dia não veio (eu sei...era de noite!)
Mas a esperança contida nisso é eterna
Sei da minha amada longe e sempre terna
E sei também da noite, do formol
E do açoite
E estou aqui ainda, esperando...

integrante do livro "Poemas de Valéria Dusaki"

Teletransporte

Imagens de iguarias e tecidos finos
Dentro de Suburbia
Quero descansar nessa cidade-desespero
Eu senti o vento com seus olhos me olhando
O fel se transformou em mel
Poluição se abriu e vi o céu
Puro, e o tiro no escuro foi só brincadeira
De crianças felizes.
Como as Cascatas e as musas
Como os morangos na CNB-09
Dentro de mim
As sensações que nunca deveriam ter ido
Embora (e por isso não foram.
É que o tempo é quase implacável. Quase.)
Fogueira na beira do mar. E depois da turba
A solidão benévola. O descanso desmaiado
Na cama, o suspiro profundíssimo
Antes de encher a cara de sonhos
Misteriosos pra dar o que falar amanhã...
Pessoas em volta, pessoas (não projetos)
Leve. E não é impossível, afinal
É passado. E se aconteceu, pode acontecer
De novo.

integrante do livro "Poemas de Valéria Dusaki"

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Tango de Fantasmas

Eu queria me revelar
Numa poesia-dissertação grotescamente amável
Eu queria poder mostrar meu coração sem medo de novo...
Amar sem nenhuma vergonha
Numa matéria no jornal da alma
Onde eu pudesse citar todas as fontes, todos os nomes,
Matéria alma e nome tudo num raio disparado dos meus olhos
Pros seus...
Como eu não sei mais quem você é
Tenho que me virar com o pouco que sou
Como um deus que perdeu a fé num Deus Maior
Esfarelando a si mesmo por consequência...
E virando humano,
Simplesmente humano,
Inevitavelmente humano.
Meu sangue corre outra vez rumo ao sonho,
Mas enquanto ele não alcança, a esperança
Soa como um inútil torpor, tango de fantasmas
Rodopiando nas nuvens sinistramente envolventes
Das memórias futuras
Nesse presente que virá
Quando eu te conhecer de novo
Tendo já te conhecido
Quando não houver mais tempo
No Amor.

Me ama

Nem sei mais se tenho coração
Agora que o sinto de novo
Como é sentir novamente?
Sentir a bala rente
Por medo de senti-la na mosca.
Onde realmente está?
A mosca do coração...
Ah, me deixa ir
Como alguém que se mata
Já sabendo da ressurreição
Mas sem saber da dor
De nascer de novo...
Me ame
Me envolva
Meu sangue
Nessa alcova
Implora pelo seu
Deus ateu
Venha com tudo como um soco no escuro
Com alma e carne
Sem capacete e escudo...
Me ama.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Um elogio à safadeza poética

Quando eu a vi,
Meu coração disparou.
Não vi pra que lado.
Provavelmente pra ela, mas ela nem percebeu,
E nem eu...
Como um raio partindo o céu imaculadamente alvo (alvo),
Ela apareceu num dia antissepticamente salvo,
E me sujou no ato da sua aparição.
E no meio da cidade ela me aparece,
Num evento que nem um alfaiate celestial tece,
Algo de estilo, algo de classe,
Algo de CARNE,
Algo de essencialmente intrigante,
Me aparece comprando uma ameixa no carrinho de frutas
Do centro da cidade.
"E por que uma deusa compraria uma fruta doce e suculenta"
-me pergunto-
"Se ela é a mãe de tudo, aliás dos prazeres
Da fruta suculenta?"
"Só pra mostrar que ela pode..." respondo...
E ela vai embora com a manga, ou a uva, ou a maçã
Com seu estiloclassecarne,
Me deixando engasgado a gritar mentalmente seu nome que eu nem sei
Com a vontade,
Muita vontade,
Imensa vontade,
Incomensurável vontade,
A essência da vontade de ser aquela fruta!
Ahhhhhhññññ...

quarta-feira, 7 de março de 2012

Aos meus amigos

Inevitável é a morte
Por isso penso nela: ela está lá
Eternamente fitando, namorando a corda da nossa existência
Mas se inevitável, por que o fascínio?
Fecha-se em si mesma, hermeticamente dentro de nós,
Não podemos manipulá-la ao ponto de moldar
O nosso bem ou mal-estar sobre
A egoísta e comunitária,
A unidade e fragmentada,
A algoz que controlamos
A raiz tão quanto ramos...
As lembranças já nos enganam
Pondo cores novas em negativos inférteis
Porém que deles novas visões emanam
Organizamos em várias ordens cenas indeléveis
Dependendo do humor e necessidade
Simples e complicada vontade.
Queria dançar como ontem
Num vento impensado, relógio quebrado porque não o percebemos
Despertando como hoje, cansado porque o descobrimos
E por que o hoje sempre parece pior que o ontem?
Porque o ontem não está mais ao alcance,
E então as cores nos negativos podem se entrelaçar
De maneira fantástica,
Pinceladas dignas de um Van Gogh...
Van Gogh pincelou tanto o ontem
Que cortou a orelha pra amortecer
Os gritos do Hoje...
"Se pelo menos
Não vivêssemos tentando ser felizes,
Até que poderíamos nos divertir bastante..."

quinta-feira, 1 de março de 2012

Estrela Eterna

Numa hora alguém sempre morre
Ou vai embora nos dias
Alguém que perde a chave do cofre
Alguém que perde a noção da alegria
Alguém que esqueceu de comer espinafre
Ou engoliu sem querer criptonita
A infância que volta só pra quem sofreu
Pois soube que a infância não mais existia

E eu sei que você encontrará essa aurora
Quem sabe eu esteja lá bem nessa hora
Em segundo plano, no sopro do vento
Na cena do seu mais sagrado momento
E o estalo que dá quando tudo está
Surpreendentemente exato no seu lugar
Vai invadir o seu corpo e sua mente e enfim
Completará-se o ciclo que te trouxe até mim

É um caos tortuoso esse sangue correndo
E seria espantoso se não fosse horrendo
Esse tropel de eventos que tentamos conter
Com nossas teorias a sangrar e escorrer
Desse corte na alma chamado razão
Que inevitável pulula o pus adentro
Sem remédio que pare a propagação
Do absurdo que corrói o mais pesado remendo

Como os olhos que eu vi sem o brilho de antes
Coração que morreu do próprio vítima exangue
A Estrela Eterna que por fim se extinguiu
O amor que se foi pra puta que pariu.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Deuses

Às vezes, quando penso,
Me sinto num cubículo sem teto,
Onde só vejo o céu.
É um aprisionamento tão livre
É uma imensidão tão enevoada
Essa do pensamento...
É que eu tenho tudo articulado
Eu sinto a prática no estômago excitado
Pelos planos
Frio na barriga imita o movimento dos pés,
Sinto a revolução nesse frio, dentro do estômago marés...
Às vezes penso muito pra não fazer nada,
Essa é a verdade.
Mas nos momentos da sinergia entre pensamento e ação
Quando o amor se revela em pele e gemidos
Quando o suor denota alma igual a coração
Quando a ideia pura vira ato destemido
É quando nós nos tornamos
Deuses.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Sombra do nada

Não há relevo que demarque o medo que sinto
Ando pelas reentrâncias da minha consciência e vejo
Névoa.
É um vazio que preenche a vida num parasitismo inócuo
Que só denota sofrimento...
Aprendo o que a morte desensina
Sofro no que depois a perversão anima
Depois do gozo a solidão
Depois do vôo desesperado o chão
Névoa, e nem é úmida,
É sêca, dela nada nasce
Nem um alarde
Nem um implorar por vida.
Naquele momento da noite me senti tão vivo
Acho que por não me lembrar tão bem do momento
Mas acho que sim, me senti águia
Sendo apenas presa bêbada
Se sentindo águia...
Ao meio-dia durmo
Ao meio-dia como
Ao meio-dia amo
Ao meio-dia morro
Tudo num meio-dia insuportável
Na metade descaradamente exata
Irritantemente exata
Do nada.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Reza aos deuses mortos

Bateu seu gosto na minha boca hoje à tarde
Seu rosto invadiu minha retina
Sem porquê, batida de carro sem alarde
Tal qual morte no jardim ermo da esquina

Gôsto de sangue na mordida ávida
Na saudade que as lembranças tentam aplacar
Como o verde na brisa de uma paisagem pálida
Como aquele gosto no gozo que não mais há

Mas eu o sinto,
Quase jorra na minha língua
No seu colo
Nas cicatrizes que eu sangro
Na fartura depois míngua
Na tortura que mitiga
Me toco, arfante puro
Puro-sangue dos desejos
Pernas, glande, porra, seios
Depois rezo aos deuses mortos
Pra no meio dos destroços
Te achar ali no meio.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Ador

Confusão,
Tem dias que tudo cai em cima de tudo
E barco que vira cais
E nada que vira mundo
Verdade antes escondida na própria sombra
E a loucura antes travestida de felicidade
Me deixa nu em pelo e escravidão
E preguiça
E falta de amor
E carinho
E arrependimento...
A verdade é a pele sedosa e sonoramente brilhante
De um leopardo após troglodita e feroz
A verdade é atroz com quem não sabe escolhê-la
Não queria escolher a verdade,
Queria o prazer de descobri-la
Não é verdade que é bom?
Não é verdade que não é mais bom
Que os dias se arrastam e me levam
Enjaulado em mim mesmo
Nela
A verdade
Ela me afoga em verdades nas quais eu queria nadar
Voluptuosamente
Calma porém avidamente
Sentindo a pele vibrar em acordo
Com o encéfalo embebido em licores
Multicolores
Multiamores...
E a dor excruciante é confusão...
Nem é dor de tão confusa.
Ador.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Esperança (morta)

Segue sêca a selva árida e hostil dos desejos
Antes suavizada pelos momentos escusos de amor
Mas o sangue não seca, segue pulsando
A vontade de chuva pra aplacar o torpor

É difícil seguir em frente com os pés fincados
Em nuvens tão confortáveis quanto passageiras
É impossível seguir em frente olhando pros lados
Tropeçando em amores que seriam pra vida inteira

E a esperança é a primeira que morre
Pra ressuscitar em sua momentânea perda
Apenas um susto pra lembrar do que importa

Como aquele que desesperado corre
Até o fim do mundo pela paixão que dói nas veias
Sem se ater às batidas atrás da porta.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Sensações...

Sorrisos secretos debaixo do colchão
Vultos nos recônditos da percepção
Ainda vultos, corpos estranhos e similares
Como as ideias brotam nos ares
Como milhões de almas surgindo dos mares

É algo à espreita, sussurros quase silêncio
Que se confundem com pensamentos
É a causa do medo de dormir, é a claustrofobia
Num campo ensolarado ao meio-dia
A salvação que Lúcifer queria

É o medo de ficar sozinho
Por achar que ainda há alguém
Auto-escravidão sinistra

É o peso de mil anos em um segundo
Apneia que dá o gostinho da morte
É um sentimento tão raso
Mas tão
Profundo...